Reality show, assim definiu Clara Ferreira Alves na SIC Notícias a indecorosa sucessão de acontecimentos em torno de José Sócrates nos últimos três dias. Iniciado com a forma como a acusação quis fazer da sua detenção no aeroporto o início de um circo mediático e depois continuado durante muitas horas a fio com as “informações” que, maquiavelicamente, ia passando para os pasquins do costume em manifesta demonstração da reiterada ilegalidade do comportamento da Procuradoria Geral da República em relação ao seu dever de assegurar o segredo de Justiça. O objetivo evidente foi o de preparar a opinião pública para a humilhação, que pretendia impor ao antigo primeiro-ministro.
Questionava a mesma Clara Ferreira Alves: se a acusação estava assim tão segura das provas que acumulara, porque se deu ao trabalho de antecipar tanta “notícia”, que estamos ainda por saber até quanto têm alguma relação com a verdade.
Uma vez mais fica demonstrada a podridão em que vegetam os protagonistas do poder judicial em Portugal: são tantas as suspeitas de corrupção de políticos de direita, a começar em cavaco com o BPN até portas com os submarinos, sem esquecer passos coelho com a Tecnoforma ou dias loureiro com todos esses casos e mais alguns e nenhum deles se sentou uma vez que fosse perante um juiz, porque os srs. procuradores da república nunca se deram ao trabalho de apurar o fundamento de tais suspeitas.
No entanto, sempre que se tratou de políticos afetos ao Partido Socialista ei-los prestimosos a acumularem indícios por irrelevantes, que se venham a comprovar, para os fazer condenar da forma absurda como nos últimos meses vimos ter acontecido com Armando Vara ou Maria de Lurdes Rodrigues.
Na altura destas condenações Daniel Oliveira questionava se estávamos perante uma inédita prova da competência da justiça em Portugal ou se não se trataria de constatar o quanto ela se revelava zarolha, apenas olhando para um único lado do espectro político. O sucedido nestes três dias faz pensar que a magistratura está efetivamente zarolha e importa que um novo governo trate de auditar o seu padrão de comportamentos de há muitos anos, todos eles destinados a limitar as garantias exigíveis para todos quantos são suspeitos de algum ilícito. Quer na forma como detêm suspeitos, quer como violam sem escrúpulos o segredo de justiça para possibilitar os julgamentos na praça pública, quer depois como arrastam longamente os processos de forma a limitarem o mais possível a recuperação da honorabilidade dos arguidos, quando são declarados inocentes.
Pior ainda: como lembra a mesma jornalista a acusação cria um tal clima de pré-condenação dos suspeitos que, nalguns casos, torna inevitável a sua condenação, mesmo quando as provas parecem mais do que insuficientes para o justificarem, como sucedeu no caso de Carlos Cruz.
Sorte terá tido o casal McCann em ser inglês, porque estariam decerto atrás das grades acusados da morte da filha de tal forma foram lançadas tantas mentiras em seu desfavor. E mesmo quando ainda andam a cuidar da condenação de gonçalo amaral por tudo quanto fez para os difamar, a justiça portuguesa vai permitindo ao delinquente as manobras dilatórias que o exima de pagar a devida indemnização por quanto congeminou.
Por isso mesmo só podemos desejar que todo este escandaloso comportamento se salde por uma reação aristotélica: tendo esticado tão violentamente a corda desejamos que os magistrados desonestos sofram o devido ricochete com equivalente coice.
À saída do Tribunal, João Araújo foi lapidar: a sua convicção quanto à profunda injustiça da decisão de carlos alexandre não resultou apenas de repetir o que qualquer advogado costuma afirmar nessas circunstâncias, mas por conhecer tudo quanto a acusação acumulou para invocar o auto-de-fé sabendo-a sem fundamentos para justificar esta medida de coação.
Para quem sempre tem apoiado e acreditado em José Sócrates não é esta prisão preventiva, que irá alterar essa manifestação de confiança. Ele continua a ser presumível inocente por muito que o queiram já dar como culpado. E lá diz o poema que atrás de tempos, vêm tempos, outros tempos hão-de vir. Desmentindo quem já julga o seu futuro político definitivamente enterrado!
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