sábado, 29 de novembro de 2014

É isso que queremos?

É claro que não vi a entrevista a passos coelho. Era o que faltava perder o meu precioso tempo a ver  um autêntico biltre, que tanto mal tem feito a milhões de portugueses. Gente que ficou sem emprego, sem casa, sem capacidade para alimentar os filhos quanto mais a si mesmos. Gente que viu os filhos partirem para outras paragens em busca do emprego, que aqui lhes passou a ser negado. Gente que, no limite, acabou nas ruas como sem abrigo ou encontrou uma das milhentas dolorosas maneiras para acabar de vez com o sofrimento.
Se o fundamento da boa governação consiste em assegurar o mais possível o bem estar dos governados, passos coelho tem feito exatamente o contrário, promovendo-lhes o sofrimento para favorecer os senhores do capital a quem assegurou impostos mais baixos e leis mais favoráveis para melhor explorar os seus precários escravos.
E, no entanto, olha-se para o telejornal e surge ele a dar-se ares de sonso - como o classificou Pedro Marques Lopes - a invocar a separação entre a política e a justiça,  mas depois a repor na agenda a questão do enriquecimento ilícito.
Questionava, e bem, Francisco Louçã: não foi passos coelho o proponente da legalização dos dinheiros fugidos para paraísos fiscais e que regressaram (ou não!) à custa de impostos obscenamente baixos? Não foi ele o responsável por uma quantidade significativa de branqueamento de capitais, que tanto contribuiu para esse enriquecimento ilícito? E, por outro lado, alguma vez tomou a iniciativa de acabar com o sigilo bancário, que será a forma mais eficaz de combater esse flagelo?
Ao trazer à baila essa antiga bandeira do PSD, passos coelho quer ao mesmo tempo cavalgar o caso de José Sócrates, mesmo fingindo portar-se com a decência, que se lhe exigia, mas também manter a guerra com o Tribunal Constitucional que, unanimemente recusou as propostas laranjas pelo que constitucionalmente está garantido como direito à presunção de inocência.
Recordemos que o PSD pretendia facilitar uma chuva de denúncias anónimas, que poria sob o fogo da Procuradoria-Geral da República uns quantos adversários políticos: enquanto se vissem obrigados a comprovar a legitimidade dos seus bens patrimoniais, ver-se-iam achincalhados pelos pasquins do costume, ficando com o seu bom nome manchado.
Estamos, pois, num momento muito sério da nossa cidadania, que levou o circunspeto Jorge Sampaio a manifestar a sua preocupação com tudo quanto se está a passar. Porque Mário Soares indigna-se e temos o Sindicado dos Magistrados a protestar. Temos José Sócrates a reagir mediante uma declaração entregue ao «Público» e à TSF e temos, uma vez mais, o Sindicato dos Magistrados a protestar. O mesmo Sindicato que, em 2010, se congratulava com a expectativa de, muito em breve, ver o poder judicial sobrepor-se na sua legitimidade ao poder executivo e ao poder legislativo.
Aonde querem chegar esses mesmos magistrados? Querem levar carlos alexandre a putativo candidato a presidente da República e por isso avisam as redações dos jornais e das televisões para estarem presentes e publicitarem a sua participação nas buscas retardadas ao BES, que parecem sobretudo um «show off»? O que seria um país com os juízes a querer mandar nele?
A última tentativa em que isso ocorreu conseguiu-se que Berlusconi dominasse a Itália durante muitos anos. É isso que queremos?

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