sexta-feira, 13 de abril de 2018

A propósito da pobreza


Há muito que passo ao lado de qualquer peditório para a instituição da «tia» Jonet e ajo da mesma forma para qualquer iniciativa com propósitos assistencialistas. Recuso-me a colaborar com quem brinca à caridadezinha, mas defendo ativamente políticas sociais, que combatam a pobreza, cabendo ao Estado o papel de melhor distribuir a riqueza, limitando a distribuição demasiado injusta dos rendimentos.

Mas a pobreza não está, enquanto fenómeno sociológico, dissociado da sua raiz política. Por isso concordo no essencial com o artigo de Jorge Cordeiro no «Diário de Notícias» em que esse membro do Comité Central do PCP defende que continuar a falar de pobreza à margem da exploração, ou seja, da apropriação da mais-valia produzida pelo trabalhador, é um exercício de cegueira política que só servirá aos que reproduzindo o empobrecimento vão subindo uns lugares na lista dos mais ricos da revista Forbes”.
Começando por invocar um estudo agora publicado sob a égide do Parlamento Britânico em que se conclui que em 2030, 1% da população terá nas mãos 2/3 da riqueza mundial, ele defende que não basta olhar para a pobreza como corolário dos baixos salários, das pensões de reforma que não dão para viver ou do desemprego. Nem apenas  para a desigual distribuição de rendimento, a injustiça fiscal ou as opções de política macroeconómica. A razão primeira para a existência de a grande maioria de pobres e a minguada quantidade de ricos explica-se no que se sabe desde que Marx o teorizou: no domínio da propriedade, nas relações de produção e da exploração do trabalho.
E, se o filósofo alemão causa muita azia a piedosas criaturas, que batem com a mão no peito e afiançam os encantos da social-democracia ou da democracia-cristã (os neoliberais são mais canhestros a defenderem os seus amanhãs cantantes), o artigo em causa cita Rousseau  ("O primeiro que, tendo cercado um terreno, se atreveu a dizer isto é meu!, e encontrou gente suficientemente simples para acreditar nele, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil") ou Almeida Garrett ("Aos economistas políticos, aos moralistas pergunto se já calcularam o número de indivíduos que é preciso condenar à miséria (...) para produzir um rico") para demonstrar o quão isso é evidente desde o século XVIII.
Conclui Jorge Cordeiro que “por mais que o recusem, a questão [da pobreza] está na crescente desigualdade da repartição da riqueza criada entre capital e trabalho.”

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