Os textos, que tenho publicado no blogue ou no facebook para defender convictamente, quer o legado dos governos de José Sócrates, quer a esperança de uma mudança muito positiva para a vida dos portugueses por um governo liderado por António Costa, tem merecido reações de alguns amigos, que não se identificam nem com estas posições, nem sequer com o Partido Socialista, seja ele acinzentado pela atual liderança, seja ele colorido pela que a antecedeu ou pela que lhe sucederá.
Porque acredito ver essas reações replicáveis em muitas outras pessoas, que ainda mantêm uma descrença ativa quanto a qualquer alternativa ao reino cadaveroso criado por este (des)governo, ou se deixam aliciar por outros projetos com os quais estou obviamente em desacordo, aproveito a missiva de um desses amigos para aprofundar a reflexão sobre as questões por ele suscitadas.
Que escreveu então o J.J., com quem há muitos anos entabulei amizade nas lutas pela defesa dos interesses da nossa classe profissional?
Desculpa lá, mas que raio têm as europeias a ver com o facto de querer ser ou não primeiro-ministro!!?? É esta mania de meter os bois à frente do carro que leva a que se deixe de focar os verdadeiros problemas. Nas europeias o teu partido também apanhou pelo que o D. Sebastião Sócrates fez! Os portugueses podem ser mansos, mas de estúpidos não têm nada. Os tempos mudam amigo e a malta já anda cansada de serem sempre os mesmos, desde há 40 anos, a darem cabo do país. Já chega! O prazo de validade desta malta toda se não expirou ainda anda lá muito perto. Venham mas é projetos novos e gente nova. O Messias chegou há 2000 anos!
Sistematizando, ficam aqui equacionadas quatro questões:
1ª tinham as eleições europeias alguma correlação com a definição de quem deverá ser o próximo primeiro-ministro de Portugal?
2ª será que o resultado eleitoral terá ainda algo a ver com a herança dos governos de José Sócrates?
3ª será presumível que a solução para os problemas do país passe por outras forças políticas, que não as que têm governado nos últimos 40 anos?
4ª quem poderá dizer que António Costa não protagoniza um projeto novo com ideias novas?
Porque cada uma delas merece que lhes dediquemos resposta mais detalhada, sem se resumir aos lugares comuns mais estafados, irei dividir a resposta ao J.J. em quatro textos sucessivos, começando naturalmente pela primeira daquelas questões: será lícita a mistura entre as europeias de dia 25 e as próximas legislativas? Eu acredito que sim: aquelas serviram de sondagem real à vontade dos portugueses neste momento quanto à forma como veem as forças políticas disponíveis para serem escolhidas para solução de governo.
Nem é apenas pelo facto de a atual direção do PS ter criado a expectativa de serem as europeias a primeira volta das legislativas! Tendo em conta as sondagens conhecidas nas semanas anteriores até era lícito optar por essa estratégia: já que elas apontavam para percentagens da ordem dos 36%, uma vitória em tal dimensão serviria de catapulta para chegar mais longe, quando os portugueses voltassem a ser convocados para as urnas.
Mais do que os próprios partidos políticos, que se apressariam a confirmar ou não o desejo de antecipação das eleições em função dos resultados, também os eleitores estavam nessa expectativa.
Pode-se sempre considerar que as elevadas taxas de abstenção seriam explicáveis pelo facto de muitos entenderem que se estava a jogar a feijões e não a sério, mas duas razões justificam a valorização da votação de 25 de maio transato:
· embora a maioria dos cidadãos não tenha disso uma consciência tão clara quanto seria desejável, as eleições europeias são tão ou mais determinantes do que as eleições legislativas, por quanto as políticas nacionais são condicionadas por diretrizes e pressões, que vêm de Bruxelas ou de Estrasburgo.
Os dois terços de eleitores que se eximiram a votar (número ainda assim empolado pela desatualização dos cadernos eleitorais, que fazem presumir o número irrealista de nove milhões de cidadãos recenseados, e pela emigração forçada de centenas de milhares de portugueses) não deixaram de dizer algo de substantivo: sentem na pele os problemas, mas não assumem a capacidade ou a vontade para participarem na solução, optando por delega-la nos que levam a sério o seu dever cívico;
· mas importa sobretudo desmontar o argumento falacioso que, por se tratarem de eleições europeias, não haveria qualquer relação com as futuras legislativas, porque isso é redondamente falso: até quando se trata de eleições intercalares para autárquicas é frequente ver os eleitores a votarem para punir ou premiar o governo central independentemente da maior ou menor simpatia, que lhes mereçam os candidatos locais. Porque o ato de votar significa tomar uma posição política face a uma realidade conjuntural, que não se estratifica em universos parcelares.
Por isso a recente consulta foi muito clara sobre o que os portugueses pensam quanto a quem querem para os liderar à frente do país. Eles:
· já não suportam esta coligação do PSD e do PP, que tanto lhes tem sonegado as legítimas aspirações a terem uma vida digna e com plena satisfação das suas necessidades básicas;
· não reconhecem na atual liderança do Partido Socialista a alternativa credível para verem infletida a contínua degradação dos seus padrões de qualidade de vida;
· não permitem ao Partido Comunista ter legítimas aspirações a conseguir dilatar o seu universo de apoiantes ao ponto de vir a constituir uma alternativa de governo pois continua a mobilizar os indefetíveis que, perante maiores índices de abstenção, permitem maiores brilharetes na percentagem final dos resultados;
· decidiram manifestar o descontentamento na candidatura populista e pessoal de marinho pinto, embora sem qualquer identificação com os princípios programáticos do movimento, que lhe serviu de barriga de aluguer e cuja tendência para se coligar com a direita era e deverá continuar a ser congénita;
A realidade política de qualquer democracia assenta na possibilidade dialética de, a qualquer momento, se identificar o líder que está no poder e, o que o poderá substituir quando se tratar de avaliar em eleições, qual o desempenho do primeiro e o projeto alternativo do segundo.
Na noite de 25 de maio ficou claro que passos coelho é reprovado pela enorme maioria dos eleitores, mas António José Seguro também não lhes mereceu a expectável aprovação.
Por isso mesmo a partir desse momento tornou-se urgente encontrar outro líder capaz de personificar um novo projeto mobilizador capaz de atrair não só os militantes - que sempre votam no partido esteja ele bem ou mal dirigido! - mas, sobretudo, todos quantos sejam conquistados pela intuição de estarem conscientemente a contribuir para a tão necessária e desejada mudança!
Em suma, nesta altura quem quer negar estas evidências clarificadas pela sondagem real ao que pensam os portugueses, só está a contribuir para uma ainda mais nefasta degradação das condições de vida dos portugueses. Porque a mudança encabeçada por António Costa merece ser testada, agora que o ainda líder do PS já demonstrou não ser capaz de para ela mobilizar quem mais interessa!
É que, com a sua declaração de disponibilidade, António Costa afirmou a confiança na sua capacidade para cumprir esse objetivo!
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