terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Quando odiar Maduro equivale a cumprir os desejos de Trump (e dos que são seus titereiros)

Há quem nada aprenda com as suas opiniões passadas. A exemplo de muitos, que se congratularam com a derrota do PT de Lula nas recentes eleições brasileiras, vejo quase os mesmos nomes a repetirem-se nas profissões de fé por Juan Guaidó e na diabolização de Nicolás Maduro.
Ontem, num debate nos «28 minutes» do canal franco-alemão ARTE, um dos comentadores do painel moderado por Renaud Dely, considerou uma imprudência inaceitável o seguidismo dos principais países da União Europeia pela estratégia norte-americana, inviabilizando a possibilidade de se tornarem mediadores de um conflito, que pode acabar num autêntico banho de sangue. Mas nada que demova esses atuais defensores da conspiração em curso, apenas motivada pela ambição das petrolíferas norte-americanas quanto a apossarem-se das enormes reservas de hidrocarbonetos existentes no subsolo venezuelano.
Relativamente ao Brasil esses entusiastas do golpista - tão compungidos com a fome e a falta de alimentos do povo venezuelano quanto escandalizados com a deportação de uma equipa de «jornalistas» de uma estação televisiva de Miami, financiada por quem concebe a intoxicação em forma de desinformação - deveriam questionar-se de valeu a pena odiarem tanto Lula para agora contarem com Bolsonaro? Se tanto os chocava a corrupção dos amigos do PT que dirão da corte em torno do atual governo, ainda mais óbvia e descarada na ganãncia dos seus propósitos? Se invocaram ridiculamente a falta de democracia do poder anterior, porque se calam perante os quotidianos os atentados à liberdade, perpetrados pelos que mandam no Planalto?
Perguntas vãs, porque a desonestidade intelectual basta para que varram da memória tudo quanto disseram e escreveram, e tenham em Guaidó a sua nova Joana d’Arc. E, no entanto, tem estado mais do que demonstrada a sua condição de marioneta dos interesses norte-americanos. De forma tão escandalosa, que os seus apelos para a invasão dos marines  a Caracas vem encontrando resistência crescente nos governos amigos, que esperavam vê-lo empossado por um grande movimento popular e, afinal, ele não surge, ou quanto muito, é contrabalançado pelo que defende a preservação da Revolução Bolivariana.
No debate da ARTE, que ontem acompanhei - felizmente que outros canais europeus conseguem escapar ao maniqueísmo primário das nossas televisões (todas unanimemente ao lado do golpe em curso!) - a defensora de Guaidó já punha a hipótese de Maduro só cair daqui a um ano se o bloqueio económico se agravar e punir o povo a maiores tormentos. Ao que outro participante no debate colocava uma hipótese académica, mas pertinente: se os norte-americanos, os canadianos e outros países compadecidos com o sofrimento dos venezuelanos quiserem entregar ajuda humanitária sem o controlo de Maduro, porque não incumbem uma das agências internacionais dispostas a fazê-lo sem comprometimento com nenhum dos lados da pugna, e igualmente recetoras das ajudas, que os russos já andam a ali fazer chegar?

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