Num muito interessante artigo no «Público» a historiadora Irene Pimentel enuncia as razões para nos inquietarmos com a crescente afirmação do ideário fascista na nossa realidade, fundamentada num canal de televisão a entrevistar um nazi-fascista ou outro a promover ativamente uma manifestação inspirada nessa mesma (falta de) cultura. E acrescenta a interpretação muito correta do jornal inglês «The Guardian», quando interpretou a agressão policial no Bairro Jamaica como o espelho de uma larvar manifestação do racismo de que estão imbuídos alguns elementos das forças policiais, capazes de dispararem balas de borracha contra quem contra eles se manifestaram em Lisboa, mas passivos, senão mesmo complacentes guardiões, dos saudosistas de Salazar, quando resolvem, igualmente, dar a cara.
As reações de quantos diabolizaram Mamadou Ba, e incensaram a polícia, revelaram a confusão de quem, nada tendo a ver com o fascismo, lhe vai servindo de caução, num fenómeno semelhante ao ocorrido na Alemanha nazi e que leva a historiadora a citar as conclusões sobre ele formuladas por Hannah Arendt: “Nos anos 60 do século XX, a filósofa judia e refugiada Hannah Arendt recorreu ao imperativo categórico kantiano, lembrando, no seu livro «Eichmann em Jerusalém», que, na Alemanha nazi, a sociedade alemã no seu conjunto sucumbiu a Hitler, num tempo em que desapareceram as máximas (morais) que determinam o comportamento social e os mandamentos da religião. Os raros seres humanos ainda capazes de distinguirem entre o bem e o mal tiveram ‘de julgar por eles próprios cada caso à medida que se apresentava, pois que não havia regra para aquilo que não tinha precedente’.”
Quando se confunde violência policial com uma mera operação de assegurar a ordem pública e se aceita como natural, que um cidadão português, nascido e criado em Portugal, não tem cabimento na sociedade plural e democrática em que exigimos viver, é essa tal serpente ilustrada num célebre filme de Ingmar Bergman, que andamos a ajudar a chocar no ovo.
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