A greve cirúrgica dos enfermeiros, as reportagens com o bastonário da Ordem dos Médicos a ter nos jornalistas, quem lhe segure no altifalante para dizer mal do SNS, ou um «estudo» da DECO a elogiar a qualidade dos hospitais privados, são três vertentes de uma guerra de resultados ainda incertos: ou os interesses dos grandes grupos económicos do setor saem vencedores e agravam ainda mais a situação de sangria dos recursos públicos para que embolsem maiores lucros, ou regressa-se ao projeto original de António Arnaut, dando primazia ao que do Estado não deveria dissociar-se.
Trata-se de uma disputa entre duas visões ideológicas opostas, uma apostando no princípio da incompatibilidade da saúde dos cidadãos com a ideia de negócio, a outra prezando exatamente o contrário. Porque sabemos bem o que isso significa: se a saúde dos cidadãos é razoável, os hospitais privados multiplicam-lhes os dispendiosos exames clínicos para confirmarem o quão bem estão. Mas, tão-só neles detetem doenças graves, que impliquem custos acima do patamar de rentabilidade, logo os enxotam para os hospitais públicos para ser o Orçamento Geral do Estado a arcar com esses encargos. Paralelamente são estes mesmos serviços públicos a garantirem a formação e os estágios aos jovens médicos para, depois, quando dotados de maiores competências, os verem atraídos por quem neles não havia investido um euro que fosse.
Tudo isto vai ficando muito claro aos portugueses que, apesar de bombardeados com notícias de disfuncionalidades do SNS sabem nele ter a resposta devida aos seus problemas de saúde. Daí que surpreenda a imprudência de Marcelo em se colar tão veementemente ao campo dos que pretendem impor os negócios privados aos interesses públicos. Como se viu no «Eixo do Mal» com Pedro Marques Lopes, nem os seus mais confessos apoiantes arranjam justificação para esse alinhamento. Que, porém, não se estranha: como poderia ele ser quem não é? Enquanto se tratar da contradição entre o bem público e o que só diz respeito a uma elite financeira, com quem sempre privou como amigo do peito, Marcelo pende invariavelmente para esta última trincheira...
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