terça-feira, 21 de agosto de 2018

Lamentável, de facto!


Consigo compreender Mário Centeno, mas não concordo em nada com aquilo que disse na intervenção destinada a saudar o povo grego pelo «fim» do programa de assistência. Por isso subscrevo por inteiro a opinião de João Galamba: foi lamentável!
Não tenhamos ilusões: acaso não tivesse sido bloqueado por Carlos Costa no acesso ao cargo do Banco de Portugal, que deveria ser o seu por mérito e curriculum, dificilmente o Partido Socialista teria contado com a sua colaboração. Porque, tendo presentes os trabalhos teóricos de Centeno antes de ganhar pública notoriedade, todos eles apontavam para orientações ideológicas muito mais à direita do que as assumidas no atual governo. Terá sido a possibilidade de dar ao banqueiro Costa uma lição, que este estaria longe de imaginar possível, a razão de ser do alinhamento com o PS.
Gabe-se a inteligência de outro Costa, o primeiro-ministro, em aproveitar a inesperada competência do seu ministro das Finanças para tornar possível a quadratura do círculo, que devolveu à precedência o Demo convocado por Passos Coelho e calou os resmungos do paralítico alemão. Mas Centeno não consegue ser diferente de si mesmo e do que pensa. Por isso mesmo conseguiu o lugar no Eurogrupo, que não serviu para que António Costa cumprisse o plano de mudar as instituições europeias a partir de dentro e, pelo contrário, o fez render-se aos encantos austericidas dos seus émulos da Europa do Norte.
Se fosse diferente de quem é Centeno teria feito os possíveis para dar à União Europeia a arma mais poderosa para contrariar a ascensão das extremas-direitas: o reconhecimento de quão errada foi a imposição da austeridade aos países mediterrânicos e ao do canto ocidental do continente, porque a boa solução teria sido a efetiva coesão entre os mais ricos e os que deles ainda muito distam na qualidade de vida. Em vez de uma União Europeia apostada na solidariedade e na entreajuda, os protestantes do Norte impuseram aos «madraços» do sul o duro castigo pela sua essência pecadora. Impuseram o egoísmo e a arrogância onde seria mais eficaz a magnanimidade e a humildade..
Quando alguém terá lembrado a Centeno a necessidade de se dirigir aos gregos e saudá-los pela sua «vitória» o resultado nunca poderia dar certo: ou mantinha a narrativa sobre os méritos da austeridade ou denunciava-a como a origem das piores ameaças que se colocaram à ideia mais utópica da Europa unida do Atlântico aos Urais. A escolha que fez trouxe-lhe as reações a que fez jus.
Se terá havido alguns iludidos com a hipótese de Centeno pôr fim a uma maldição, a realidade encarrega-se de demonstrar que tomou-o o sortilégio, que tende a transformá-lo no aprendiz de feiticeiro por que suspirava Wolfgang Schäuble para se ver substituído como Mago-mor do neoliberalismo ainda dominante.

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