segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Uma União sem conserto

Existirá ainda salvação para o projeto europeu?
Fiel ao seu ideário de salvaguarda do capitalismo só a direita parece apostada em crê-lo, e aqui se incluem os que, ainda dentro do Partido Socialista, não se reveem na atual solução governativa. Francisco Assis é o seu exemplo mais eloquente, muito embora todo o setor derrotado nas Primárias de 2014 deva continuar a crer no futuro de uma instituição que lembra um navio a meter água por ambos os bordos.
É certo que António Costa tem mantido um discurso ambíguo de quem vai reconhecendo os limites do seu desejo de mudança no presente estado das coisas, mas ainda sabe ser cedo para redefinição constitucional do país quanto aos seus compromissos internacionais como desejariam os parceiros parlamentares. Mas quantos socialistas identificados com a estratégia do seu líder podem discordar de João Semedo quando, na entrevista de ontem ao «Público», fez a sua leitura do que se está a passar?
“O Reino Unido vai deixar a UE, vários Estados membros não cumprem resoluções do Conselho Europeu — veja o que se está a passar com os refugiados e migrantes —, as eleições para o PE têm taxas de participação baixíssimas, sempre que alguma coisa relacionada com a UE vai a votos é derrota pela certa, o desemprego não para de crescer e a economia europeia está numa crise arrastada, há pobreza na Europa como há décadas não se via, as desigualdades entre Estados e entre regiões acentuam-se em vez de se esbaterem. É difícil não ver nisto uma União Europeia a desagregar-se, lenta mas inexoravelmente. A UE falhou e não vejo que tenha conserto.”
Os ingleses e os galeses, mesmo que manipulados pela demagogia populista do UKIP e de um setor importante dos tories, puseram o acento na ferida, quando repudiaram a presente falta de democracia nas instituições europeias e o seu enfeudamento aos interesses dos grandes grupos financeiros. Depois de ter constituído a esperança de se transformar na tradução prática de uma Europa das nações e dos seus povos, a União Europeia constituiu-se, nas alterações subsequentes à queda do Muro de Berlim, como a ferramenta ideal para o capitalismo europeu se reestruturar e encontrar um modelo eficaz para ir sobrevivendo.
Nesse sentido, e por muito que os teóricos do marxismo e do leninismo tenham teorizado sobre a necessidade de internacionalização dos explorados - era a palavra-de-ordem “Proletários de todos os países, uni-vos! - foram os capitalistas a serem mais lestos na consagração desse princípio. E, hoje em dia, até se revelam particularmente eficientes na exploração da tónica nacionalista, que só facilita a sua estratégia de ir dividindo para reinar. Não espanta, pois, que a classe dominante representada pelos seus governantes, ou pela maioria dos seus partidos, tenha sido tão bem sucedida na difusão da ideia de se trabalhar arduamente no norte da Europa para que os “madraços” do Sul recebam fundos europeus e financiamentos a juros quase inexistentes.
Para João Semedo os danos são irreversíveis e a luta para os reverter vai ser prolongada: “a União hoje é um enormíssimo mercado e é isso que interessa aos seus mentores, é isso que protegem. Não creio que tanto poder se esfarele como se esfarelou a União Soviética e os países do Pacto de Varsóvia. Vai ser um duro e prolongado confronto.”
Mas como cantava Zeca Afonso, se a luta é dura, mais dura é a razão que a sustem. E por isso continuamos apostados nela. Diariamente e sem perder o norte... 

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