Foi Marguerite Yourcenar quem escreveu, que o Tempo é um grande escultor. Por isso mesmo, nunca prescindo do otimismo com que antevejo o futuro, mesmo nas situações em que ele parece mais sem esperança.
É claro que há sempre exceções: os sitiados no gueto de Varsóvia sabiam-se condenados e por isso avançaram para a revolta como o último recurso para preservarem a sua dignidade. Mas teria valido a pena a Virginia Woolf ou a Stefan Zweig suicidarem-se, em Inglaterra ou no Brasil respetivamente, por considerarem inevitável uma globalização nazi?
É por isso mesmo que, apesar de indignado com o golpe em curso no Brasil, tenho uma enorme expectativa quanto ao reverso desta situação: Dilma perderá o cargo, mas quem já antes soube lutar e vencer a ditadura, combater e derrotar o cancro, vai agora ceder ao provisório desaire sem preparar a reviravolta ansiada por milhões de brasileiros? Os senadores, os deputados, os panfletários da Globo e outros meios de comunicação social ou a elite endinheirada, que agregaram forças para conseguir vergar momentaneamente a Democracia não sabem com quem se foram meter! Já lá vem outro carreiro!
Outra derrota anunciada, que se transformou agora em vitória para os milhões por elas ameaçados, foi o anúncio do fracasso das negociações para a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP), que franquearia as portas já arrombadas da Europa aos ditames das multinacionais norte-americanas com a Monsanto na linha da frente.
Durante os últimos anos quiseram-nos convencer de se tratar de um tratado imprescindível para o futuro sucesso económico da Europa, apesar de sabermos quem verdadeiramente lucraria com ele - os alemães, obviamente!
O reconhecimento desse insucesso pelo vice-chanceler alemão constituiu uma boa notícia e a prova de que vale a pena contestar sem tréguas o que promete virar-se contra nós.
Confiar no tempo também deveria ser o que Pedro Sanchez deveria assumir. Nesta altura em que Rajoy e Rivera andam de braço dado a prometer mundos e fundos sobre o futuro imediato a vida dos espanhóis, não será muito asizada a decisão de forçar uma terceira convocação de eleições.
Com uma «maioria» sempre na corda bamba basta confiar que o Partido Popular volte a comportar-se como o escorpião da fábula: a corrupção está-lhe na natureza e não é uma jura de bom comportamento, que irá travar os seus cabeças de cartaz. Será bem mais judicioso voltar às urnas, quando a usura consumir em lume brando uma forma de exercer o poder mais do que esgotada.
Tempo também é o que os curdos melhor têm a fazer quanto a Erdogan. Com o exército fragilizado pelo afastamento dos seus elementos mais experientes, o ditador turco avançou claramente no tipo de estratégia de correr a toda a brida para a frente. Tropeçar e partir os queixos é o mais natural que venha a suceder, porque dificilmente terá engenho para conseguir o crescimento económico dos anos mais recentes, com o abandono dos turistas e dos investidores estrangeiros, e para vencer os inimigos internos e externos, que não se cansa de provocar.
No Brasil, em Espanha, na Turquia e nos meios financeiros especulativos (os mais interessados pelo TTIP), o tempo vai afagando as asperezas, que infernizam a vida dos mais fracos. Em todas as latitudes, um outro devir se adivinha possível...
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