sábado, 21 de março de 2015

Quando ser mau líder decorre de perversa intencionalidade

Na minha longa carreira profissional sempre houve uma pedra-de-toque, que permitiu separar os que eram os bons líderes dos maus líderes. Os primeiros estavam sempre na linha do combate às dificuldades e davam a cara pela sua resolução, quer ela se revelasse eficaz ou nem por isso. Os segundos sempre procuravam escamotear as responsabilidades, atirando as culpas para os seus subordinados.
Quando recordo exemplos de uns e de outros é inevitável encontrar nomes incontornáveis dos quais só aqui reterei os primeiros, porque aos maus chefes mais vale remetê-los para o anonimato de que nunca mereceriam ser resgatados.
E de entre esses excelentes chefes com quem tive o privilégio de trabalhar, o Luís Filipe da Soponata foi o mais inesquecível.  A forma como eu próprio lideraria com incontáveis equipas nas décadas seguintes a com ele ter trabalhado muito deve ao modelo, que aplicava.
Conto um caso concreto, que muito o define: em 1976, era terceiro Oficial Maquinista do «Montemuro», quando encetámos mais uma viagem em direção ao Golfo Pérsico.
Estávamos no pico do verão e uma das maiores dificuldades da viagem residiria no calor intensíssimo do Mar Vermelho, com as temperaturas da água do mar a chegarem facilmente aos trinta graus.
Embora contássemos com a consola, onde passávamos uma boa parte de cada turno de quatro horas de serviço, a temperatura na casa das máquinas era quase insuportável, ultrapassando os cinquenta graus centígrados.
As horas de descanso no camarote ou nos salões eram um bálsamo para recuperar da desidratação a que estávamos condenados.
Foi, nessa altura, já deixado o Suez para trás, que o único compressor de ar condicionado da instalação decidiu avariar.
Embora não implicasse qualquer condicionalismo à operacionalidade do navio, logo o Chefe Luís Filipe criou uma dinâmica de resolução da avaria, chamando à discussão da estratégia todos os oficiais, desde o mais experiente ao mais jovem. Para ele, a dificuldade era para ser vencida pela equipa e não propriamente pelo mérito e capacidade deste ou daquele.
Nas horas seguintes foi feita a desmontagem, a identificação das necessidades em peças e materiais, que convenientemente existiam no paiol, e a reparação.
Quando voltámos a aceder ao conforto das condições de habitabilidade nos camarotes, adequadas ao nosso melhor desempenho, sentimos a galvanização de, também nós, os mais jovens, termos sido parte da solução.
Vem isto a propósito do sucedido esta semana com o secretário de estado dos assuntos fiscais, paulo núncio.
A exemplo do que já víramos no comportamento de nuno crato e de paula teixeira da cruz, o autor, por ato ou por omissão, da lista de contribuintes VIP despachou as culpas para os colaboradores mais próximos.
Em vez de dar o peito às balas e assumir as responsabilidades, que lhe são indissociáveis, pôs-se a léguas e considerou nada ter a ver com o caso.
Tratar-se-ia da demonstração plena da falta de competência para exercer cargo público, se não fosse bem pior. É que Pedro Adão e Silva sugere nisto uma intenção bem definida: “O padrão é sempre descartar responsabilidades  políticas em tudo o que envolva a administração pública. A interferência do Governo é mais vasta e invariavelmente no mesmo sentido: por inação ou por ação, degradar os serviços do Estado e responsabilizar os funcionários públicos por tudo o que corre mal. A estratégia não está a ser eficaz?” 

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