Às vezes sou tentado a meter-me na máquina do tempo e a olhar - não de muito longe! - estes tempos, que vamos vivendo. Por exemplo, à distância de dez anos, quando a Agenda para a Década anunciada por António Costa já se tiver conjugado com a inversão total do discurso ideológico europeu à conta de uma ou outra syrizada e com a estonteante derrota do tea party na corrida presidencial para a sucessão de Obama.
Otimista na vontade, e sem ter grande vontade para me mostrar pessimista na razão, espero estar quase a chegar aos setenta anos de idade e encontrar um planeta bem mais decente do que este por ora a dar motivos ao nosso indignado descontentamento.
Nessa altura espero partilhar com muita gente o distanciado espanto por, nesta primeira metade da segunda década do milénio, Portugal ter contado com a mediocridade tacanha de um presidente mesquinho e com a mesquinhez serôdia de um primeiro-ministro medíocre? Como se poderá explicar a posteriori, que os portugueses tenham ido às urnas dar o voto para pôr no poder dois tão crapulosos figurões?
Porque o crescimento já será uma realidade e o desemprego uma exceção, veremos uma direita novamente a dizer-se defensora dos paradigmas neokeynesianos da economia? Se em 1975, do CDS ao PSD, toda ela tecia loas ao socialismo, não lhe custará mascarar-se de vestes socialmente empenhadas enquanto a renovação dos partidos socialistas e sociais-democratas prosseguir à conta dos contributos trazidos por quanto tiver, entretanto, acontecido na Grécia, na Espanha ou na Irlanda.
Remetidos os rosários teixeiras e os carlos alexandres para o mesmo caixote do lixo onde passos coelho, paulo portas ou cavaco silva já terão definitivamente apodrecido, reavaliar-se-á a governação socialista de Sócrates e corroborar-se-á o que tudo nela era inovador e terá voltado a ser revalorizado: a aposta na formação e na requalificação (verdadeira) de quem trabalha, as energias renováveis, a simplificação dos procedimentos administrativos, a importância conferida ao estudo do inglês e ao uso do computador desde os primeiros anos escolares, etc.
Se Luther King teve um sonho e ele lá se vai realizando, mesmo que à custa de situações como a de Ferguson, também eu tenho o direito de olhar para o futuro e ver como a cobardia e a miséria moral deixarão de ter afirmação no espaço político, que a presunção de inocência continuará a ser um valor inalienável de uma justiça digna desse nome e que pasquins como os da Cofina nem para papel higiénico servirão, porque até os mais pobres dos portugueses terão o direito de amaciarem as suas partes mais pudibundas com a qualidade dos produtos da Renova.
A dez anos de distância, quero crer que esse futuro será possível...
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