Aceitemos, então, as canções do Sérgio Godinho como banda sonora dos nossos gestos e pensamentos. Temos o brilhozinho nos olhos desde que iniciámos a participação na campanha para as Primárias do Partido Socialista. Quando quisemos sacudir a tristeza imposta por quem nos quis convencer quanto a não haver outro caminho, outra alternativa.
De repente, o ar compungido que durava desde a manifestação do «Que se Lixe a Troika» de março de 2013 - quando integráramos o desalentado exército que percorrera as ruas do país apenas para dar expressão à sufocada indignação - dava espaço à esperança perante algo de novo a anunciar-se dois dias depois das eleições europeias nos quererem convencer de que tudo continuaria a ser assim, sem jamais vir a ser diferente.
Durante semanas andámos nas ruas a mobilizar quem se identificava com essa mesma necessidade de mudança, e contactámos a amigos e conhecidos para engrossarem o caudal de um rio, que avançava impetuoso para a foz.
É claro que surgiram meandros mais apertados e obstáculos aparentemente intransponíveis capazes de inquietarem as certezas na anunciada vitória. Até porque, muitas dessas dificuldades, provieram de comportamentos pouco edificantes de quem deveria ter a responsabilidade de tudo conduzir com lisura e elevação.
Pessoalmente sempre tive grande confiança no desiderato, porque fui reencontrando rostos há muito perdidos na voragem dos tempos e que partilhavam a mesma vontade em sacudirem a inércia de repouso para se afirmarem na urgência da reviravolta. Por isso, às vezes, os textos aqui publicados tiveram de ver morigerados as tentações de excessivo triunfalismo.
Ainda assim, a dimensão de quantos participaram e votaram em António Costa, excedeu o que antecipava como possível. Porque, de repente, sentimos a agradável surpresa de 15 de setembro de 2012, quando tivéramos a sensação de invadirmos Lisboa para dizer não à TSU e pouco ter faltado para reviver o espírito do assalto ao «palácio de inverno».
Daí uma ainda mais superlativa alegria! Partilhada ao fim da noite no Forum Lisboa com quem ali quis estar presente em mais um grande momento da nossa Democracia.
Porque, voltando às canções do Sérgio Godinho, sentimo-nos no primeiro dia do resto das nossas vidas. Com tudo em aberto para confiarmos na exequibilidade de voltarmos a ter um governo como eles devem sempre ser: «do povo, pelo povo e para o povo». O exato oposto deste ainda vigente mas ontem declarado à beira do fim depois de ter feito desse mesmo povo o seu inimigo em nome dos interesses ditados de fora.
Por tudo isso ontem foi, de facto, um daqueles dias raros como os que Godinho cantou no seu «Domingo no Mundo»:
Por motivos talvez claros
o prazer é o que nos torna
os dias raros
o prazer é o que nos torna
os dias raros
De facto, por motivo absolutamente claro!
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