Às vezes há séries televisivas, que se ajustam com particular acuidade a quanto estamos a viver num dado momento. Foi o que senti esta semana ao ver o último episódio de «Crossbones», a série da NBC apresentada durante este Verão nas televisões norte-americanas e que um dos canais por cabo nos permitiu acompanhar quase em simultâneo.
Para os que não tiveram o prazer de a ver, a história conta-se assim: durante o século XVIII, na minúscula ilha caribenha de Santa Campana, funciona uma República de Piratas dirigida por Edward Teach, cuja alcunha é o Barba Negra, e é interpretado por John Malkovich.
Embora ninguém lhe conteste a liderança, todos os cidadãos da ilha são ardentes defensores da cultura de igualdade e de fraternidade, que entre todos impera. Por isso mesmo, mais do que um líder autocrático, Teach, também conhecido por Comodoro, comanda pela sageza e pela capacidade estratégica em definir os objetivos corretos para que todos prosperem. Muito embora sejam evidentes os sinais da brutalidade e cupidez, que lhe norteiam a personalidade.
Tudo se complica quando, em vez de dar primazia à capacidade de angariar novos recursos para os seus cidadãos, atacando navios ingleses ou espanhóis, Teach deixa-se conduzir pelos seus desejos pessoais de afirmação perante aquele que definiu como o seu inimigo de estimação: o governador da Jamaica, William Jagger.
Quando ele passa a pensar fundamentalmente no seu inchado Eu em menosprezo pelos interesses e valores da sua comunidade está condenado. Tanto mais que, quando tem à vista a enorme riqueza de uma vulnerável frota espanhola, decide esquecê-la em proveito de um combate final com Jagger, que atrai à ilha para o poder derrotar.
Só que o saldo é desastroso: os ingleses perdem, Jagger é morto, mas a própria comunidade de Santa Campana fica devastada, reduzida a um punhado de sobreviventes.
No final o médico da ilha, Tom Lowe, toma a decisão de derrubar Teach, impedindo-o de continuar a fazer mal a quem sobreviveu a tal batalha. Assumindo-se como aquele que verdadeiramente retomará os valores da igualdade e fraternidade, que nunca deveriam ter sido secundarizados pela ambição pessoal de um líder sem as qualidades para o ser.
A longa descrição da história decerto não impediu quem a leu de ver o paralelo com a história recente do Partido Socialista: temos uma instituição política com uma história notável em prol da igualdade e da fraternidade entre todos os cidadãos e, infelizmente, deixámo-la ter sido tomada de assalto por um líder incompetente, que sempre olhou mais para o umbigo do que para o objetivo prioritário de dar melhor qualidade de vida aos cidadãos do seu país.
Como dizia António Costa no debate desta semana, António José Seguro terá alimentado a ambição de vir a ser primeiro-ministro desde pequenino não importando por quem ou como. E que terá criado, entretanto, o seu Jagger de estimação em José Sócrates, que viu sair da mesma região do país para ter sucesso onde ele foi marcando passo.
Até que a sua cegueira terá posto em causa o futuro dos seus concidadãos, possibilitando uma vitória eleitoral a uma Direita, que deveria ter entrado em 2014 a ser o mais execrada possível pelo eleitorado a quem tantos danos causou.
António Costa faz, pois, o que Tom Lowe assume na série: torna-se no líder alternativo como verdadeiro representante da tal cultura de igualdade e fraternidade, que estão na raiz da fundação do Partido Socialista. E por isso irá ganhar na eleição de domingo!
Mas resta uma inquietação: quando julgávamos, que o Comodoro não sobrevivera ao combate final com o vencedor Tom Lowe, encontramo-lo na última cena a arrastar-se com determinação numa praia deserta da ilha. Sentindo-se-lhe a vontade de «continuar por aí».
E os socialistas têm todas as razões para se inquietarem com os danos que o ego ferido de Seguro ainda poderão vir a produzir no futuro...
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