Vulto relevante da esquerda internacional, Naomi Klein conseguiu impor-se na cena política internacional graças a uma boa dose de ativismo político e à publicação de alguns ensaios em que denuncia o capitalismo e o liberalismo, doutrinas que garantiram a Donald Trump o sucesso político através do estatuto de «megamarca».
Atualmente ela defende que se lancem as bases de uma resistência à atual Administração e descodifica o que se esconde por trás dessa eleição e da sua «estratégia de choque». Para tal publica regularmente artigos de opinião no «The New York Times», no «The Intercept», no «Daily News» e no «The Boston Globe».
Nascida no Canadá, continua aí a viver, embora os progenitores fossem norte-americanos e conotados com a sua esquerda mais radical: o pai, futuro médico, escapara ao recrutamento para o Vietname, vindo acompanhado da namorada, que se converteria em realizadora de filmes feministas.
Na Universidade Politécnica de Montréal Naomi começa a escrever artigos para o respetivo jornal destacando-se na defesa da causa feminista e passando depois para a profissionalização nesse ofício da escrita ganhando rápida notoriedade planetária com um primeiro ensaio - «No Logo» - sobre a tirania das marcas publicitárias. Seguir-se-ão «A Estratégia do Choque», sobre a ascensão de um capitalismo desastroso e «Tudo Pode Mudar» sobre os efeitos perniciosos do capitalismo no clima. Com «Dizer Não, não basta» - agora publicado - ela apresenta a eleição de Donald Trump como a consequência do capitalismo sem regras e com riscos muito sérios para o futuro do planeta não bastando dizer não a esta realidade, antes criando uma contra narrativa, que a substitua por outra completamente diferente.
Dividido em quatro partes o ensaio começa a abordar como chegámos aqui, o que só foi possível graças à ascensão das supermarcas.
Na segunda parte trata de onde estamos agora, com o clima de desigualdade a ter repercussões não só sociais, mas também ambientais. Por isso a terceira parte tem por tema a possibilidade de tudo poder piorar em função de choques expetáveis, traduzidos em catástrofes, que deem o ensejo de alguns aproveitarem para contornarem a Democracia. A concluir Naomi rastreia as condições para que tudo possa melhorar.
Se através daquilo que designa como «estratégia do choque» Donald Trump se tem revelado um mestre na arte da diversão criando situações que distraem a opinião pública com opiniões, comportamentos ou outras atitudes surpreendentes, ele e os seus cúmplices andam nos bastidores a conseguir um conjunto de benefícios para as grandes empresas, mormente a nível da desregulamentação fiscal ou ambiental, que passam sem grande sobressalto público.
Todas as promessas com base nas quais foi eleito - a defesa dos operários, da Segurança Social, dos cuidados médicos - foram rapidamente esquecidas, bem como o de distanciar a sua Administração dos grandes grupos financeiros, que acusara como causa de todos os males. Na realidade, tão só empossado no cargo, ele chamou para seus mais próximos colaboradores quem provinha desses grupos para os quais está realmente disposto a legislar e a intervir. A Goldman Sachs, por exemplo, nunca teve tanta influência como a que usufrui na atual Administração.
Ao contrário dos que consideram desesperada a situação, porque a esquerda norte-americana não consegue convergir numa força de oposição suficientemente forte, Naomi Klein vê sinais de esperança no facto de relativamente aos seguros de saúde os Republicanos não terem conseguido sonegá-los a milhões de cidadãos cuja cólera não ousam estimular. Pelo contrário, em vez de deitarem o Obamacare para o lixo, os Republicanos não têm conseguido travar uma nova dinâmica de exigência de um Sistema de Saúde universal e gratuito para todos de acordo com as propostas de Bernie Sanders e, portanto, bem mais avançadas do que as garantidas pela anterior Administração.
Mesmo nas questões relacionadas com o clima, a retirada de Trump dos acordos de Paris tem sido compensada pelo conjunto de grandes cidades norte-americanas dispostas a cumpri-lo, desautorizando o poder federal.
Tendo-se apresentado como um candidato contra um indefinido Sistema para o qual conseguiu garantir a incauta indignação de milhões de eleitores, que nunca nele poderiam encontrar quem lhes defendesse os interesses, Trump tenderá a ser visto precisamente como símbolo daquilo que estigmatizou como origem de todos os males e a ser ele mesmo sujeito a igual contestação. É que, doravante, caída definitivamente a máscara, ele já não conseguirá voltar a apresentar-se como verdadeiramente não é.
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