Em maio de 1970 recebi da NASA um volumoso envelope com documentação entusiasmante sobre a recente alunagem da Apolo 11. Para o miúdo de catorze anos que, meses atrás, havia escrito para a agência espacial norte-americana, aquela resposta às perguntas por certo ingénuas que lhes formulara, foi motivo de gáudio para as semanas de férias de verão então no seu início. Se já era leitor voraz dos pequenos livros da Coleção Argonauta, ainda mais fiel deles fiquei, devorando as histórias contadas por Arthur C. Clarke, Philip K. Dick, Ray Bradbury ou Ursula LeGuin e imaginando devires prováveis. Quem então me questionasse como veria o futuro a cinquenta anos de distância decerto teria por proposta a ideia de, então, se vir a viver numa realidade como o que Kubrick acabara de revelar no seu «2001, Odisseia no Espaço».
Hoje em dia, sexagenário, por certo estaria reformado a passear pelas diversas colónias terrestres do Sistema Solar, quiçá das ainda mais distantes, talvez visitando os filhos e netos, que por elas se espalhariam.
Hélas! A realidade ficou muito aquém da ficção e se quis dar seguimento à ânsia pelas viagens tive de me acomodar à vida de Oficial da Marinha Mercante, onde passei grande parte de duas dúzias dos anos pretéritos. Ainda assim o acontecimento de hoje - a entrada da sonda Cassini na atmosfera de Saturno, onde se incendiará antes de conseguir alcançar-lhe a superfície - desperta algo dessa inocência adolescente e faz-me sentir alguma pena por nunca ter conseguido ir mais além da superfície da Terra do que nos voos de avião, que frequentemente a escondem abaixo do manto de nuvens. Presumo que alguns dos descendentes, que continuarão a imortalizar-me um pouco no seu ADN, virão a conhecer esses longínquos futuros, mas não me caberá a sorte de viver essas experiências galvanizantes.
Cabe-me sim admirar o enorme esforço científico, que tornou possível a viagem de uma pequena sonda espacial que, partida de Cabo Canaveral a 15 de outubro de 1997, viajaria milhões de quilómetros para melhor nos dar a conhecer esse planeta do qual Galileu descobriu a singularidade dos seus anéis em 1610. Pelo caminho deixou o módulo Huygens, que foi despenhar-se em Titâ, um dos seus satélites, para melhor lhe conhecer a densa atmosfera de azoto e hidrocarbonetos.
Esta notável aventura espacial salda-se por inesgotáveis dados científicos, nomeadamente na forma de fotografias, que permitem conhecer os ecossistemas desse longínquo vizinho planetário e encontrar modelos de interpretação mais latos para o prodigioso número de exoplanetas, que se vão descobrindo noutros sistemas estelares. É admirável o investimento em curso para ir mais além do que está à nossa volta e projetarmo-nos num espaço tão infinito quanto os mares sugeririam aos nossos navegadores do século XV.
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