Não será propriamente um acaso que a interpretação dos resultados eleitorais pela direita e pelos sobreviventes do segurismo tenham coincidido: na prática eles navegam nas mesmas águas e terão interesse óbvio em fazer passar a ideia de uma grande derrota socialista.
Ouvem-se até coisas extraordinárias: ora lamentam a marginalização a que terão sido sujeitos por quem liderava a campanha de Maria de Belém, como se a sua colaboração tivesse-a conduzido a uma grande vitória sobre Marcelo e sobre Sampaio da Nóvoa, ora suportam os argumentos na soma aritmética da percentagem da antiga presidente segurista e do ex-reitor da Universidade de Lisboa.
Passado quase ano e meio sobre a grande derrota nas primárias, Álvaro Beleza ainda se atreve a pôr em bicos dos pés sempre que julga chegado o momento de ofender a inteligência da enorme maioria dos socialistas. Numa altura em que Henrique Neto parece, enfim, disposto a desvincular-se de um partido com que não tinha qualquer afinidade, podemo-nos perguntar o que ainda nele faz o último moicano de uma guerra definitivamente perdida.
Na mais recente «Quadratura do Círculo», Jorge Coelho pedia que se fizesse justiça a António José Seguro por nunca mais ter opinado na vida pública desde a noite da sua derrota. Podemos, e até devemos tê-lo em conta, mas a verdade é subsistir um segurismo sem Seguro, que é cada vez menos nocivo, mas ainda incomoda.
Mas estes dias têm-se revelado assaz interessantes para os criadores de enredos na comunicação social. Outro bom exemplo tem a ver com a previsão de muitos comentadores quanto a uma iminente reação da CGTP contra o governo, para dar ao PCP prova de vida depois do seu resultado eleitoral. Afinal nem a greve prevista para sexta-feira se verificará, com os sindicatos da função pública a desconvoca-la. É que o atestado de estupidez, que pretendiam passar aos comunistas revelou-se inconsequente, já que a leitura por estes feita do resultado de Edgar Silva não coincide em nada com essa vontade inconfessada de muitos em ver abreviada a vida do governo de António Costa.
Como Nicolau Santos escreveu no «Expresso» o primeiro-ministro “deve estar muito preocupado, deve”, com os resultados de domingo. Afinal os que mais se identificaram com o rumo por si traçado (Sampaio da Nóvoa e Marcelo) foram os mais votados, logo seguidos pela candidata (Marisa), que com ele se revelou cúmplice, quanto mais não seja por omissão. Quanto aos que mais o causticaram diretamente (Henrique Neto) ou por essa mesma omissão (Maria de Belém) tiveram os resultados, que se viram.
A “derrota” lida por muitos acabou por ser uma enorme vitória de António Costa, mesmo que, no íntimo, desejasse ter por parceiro em Belém um Presidente muito mais identificado com a sua visão estratégica para o país...
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