Há uns dias atrás o médico Constantino Sakellarides formulava como desejo íntimo que todos quantos passam horas a fio nas televisões a falar futebolês metessem umas férias infindas. E eu dei-lhe totalmente razão!
Em certos dias da semana liga-se a televisão e procura-se nos canais de notícias por cabo algum informação política e lá temos uns senhores de ar empertigado a falar com toda a seriedade o que se limita a ser um espetáculo de vinte e dois tipos a correrem atrás da bola e com um a apitar.
Sim, eu sei que o futebol é um fenómeno de massas e por ele se exorcizam muitas frustrações coletivas. Mas contribuirá ele, no que quer que seja, para a melhoria da nossa sociedade? Ou pelos ódios estúpidos, que suscita, até causa sérios danos em quem dele sofre consequências diretas ou indiretas de exaltações repentinas?
Não é que o fenómeno me seja totalmente alheio: também eu, desde miúdo, tenho a minha simpatia clubística. E até fico moderadamente satisfeito se o meu clube ganha algum campeonato. Mas, por exemplo, fico muito mais agradado se o presidente do meu clube vai a Évora visitar José Sócrates do que dez campeonatos, que possa ganhar.
O futebol voltou à dimensão nociva da época fascista em que integrava um dos três «F».
O “faduncho choradinho de tabernas e salões” talvez tenha desmerecido de tal qualificação, porque a própria Amália pôs-se a cantar poetas não propriamente conotados com o regime.
Fátima continua a ser o que é: um espaço de ilusão onde se formulam votos e se pagam promessas de dificuldades, que nada têm a ver com a transcendência de um qualquer deus.
Mas é o futebol, enquanto fenómeno de alienação de massas, a ser o pior dos éfes.
Porque a maioria dos que são capazes de passar horas nos empregos, nos cafés ou nas praças públicas a discutir o talento, ou a falta dele, dos jogadores ou dos treinadores, são aqueles que dizem não se interessar pela política, porque «os políticos são todos iguais!». E, no entanto, são eles quem sofrem amiúde os efeitos do desemprego ou da precariedade, com baixos salários à mistura.
A direita está tão interessada em manter as mentes dos portugueses aferrolhada nessas ilusões, que destacou para esses programas de futebolês muitos dos seus dirigentes. Olha-se para os paineleiros desses programas e vêem-se antigos dirigentes do CDS e do PSD, que terçam os seus argumentos com a mesma carga emotiva com que no passado denegriam as propostas do PS ou dos demais partidos à esquerda. Eles sabem-se igualmente úteis agora, enquanto marionetes dos interesses, que não querem ver os verdadeiros problemas dos portugueses, e dão-se ao prazer e ao proveito de recolherem as correspondentes lentilhas.
Assim, não admira que o melhor de todos os comentadores de política na televisão, Augusto Santos Silva, tenha sido despedido da TVI por se insurgir precisamente contra os tratos de polé recebidos pela sua rubrica, sempre preterida em função das “urgências” futebolísticas.
É por isso que Sakellarides tem razão: era mandá-los a todos de férias sem bilhete de regresso!
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