Entre incêndios, que vão apoquentando populações, e polémicas idiotas sobre cartazes, este agosto vai-se convertendo numa autêntica “silly season”, sem grandes notícias que justifiquem a nossa atenção. Por isso mesmo escolho, como alternativa, uma excelente entrevista para a qual o Valdemar Cruz me chamou a atenção num artigo do «Expresso Curto» e que foi publicada no «El Pais». O que motivou essa peça jornalística foi a publicação do seu ensaio “Economía para el 99% de la población”.
O entrevistado é o professor Ha Joon Chang, um coreano que está radicado em Cambridge, em cuja Faculdade de Económicas é professor. E uma das surpresas que tem constatado é a sua progressiva conotação com quem é tido como professando opiniões radicais. Logo ele que, desde os tempos de estudante nos anos 80, nunca teve qualquer simpatia pelas ideias maoístas, ou até vagamente marxistas. Mas, quase todos parecem ter derivado para a direita, deixando-o acompanhado com os que são execrados por pensarem nas coisas fundamentais, ou seja por irem à raiz dos problemas. Nesse sentido, sim, ele acaba por se aceitar radical, porque interpreta o mundo de acordo com o que vê e mede e não de acordo com os cenários falaciosos dos defensores da atual ortodoxia económica.
Segundo Chang a economia dos últimos trinta ou quarenta anos replicou o papel da teologia católica da Europa medieval, enquanto ideologia para justificar a preservação do presente estado das coisas.
Se nos é “permitido” ter opiniões convictas sobre assuntos como o aquecimento climático ou a política norte-americana no Médio Oriente, quando chegamos às questões económicas tentam convencer-nos de tratarem-se de matéria inacessível, apenas compreendida por uns quantos especialistas.
“Isso constitui um enorme obstáculo para a democracia. Excluem-se as decisões económicas mais importantes do debate e escrutínio democráticos”.
E, no entanto, já está mais do que demonstrada a precipitação em levar por diante a moeda única. Ela faz sentido nos EUA onde existe uma unidade geográfica e linguística, que garante a normalidade das transferências de recursos dos Estados mais ricos para os mais pobres. Na Europa a inobservância daqueles requisitos causaram os problemas presentemente associados ao euro.
Constatando que os bancos envolvidos na compra da dívida grega não estão a pagar o custo das suas decisões erradas, Chang não vê outra solução para a ultrapassar, que não passe pela sua reestruturação e por um perdão parcial.
Chang reconhece inteligência na redefinição do que era à partida uma crise financeira numa crise fiscal. Primeiro os governos foram estimulados a tomarem medidas keynesianas para evitarem o colapso iminente. Mas, quando este abrandou, tinham-se endividado e viram-se acusados de despesismo irresponsável. Estava aberto o caminho para a imposição de fortes medidas de austeridade.
E, no entanto, Chang alerta: não só elas nada resolveram como deixaram as economias europeias fragilizadas para responderem a uma nova e previsível crise financeira. É que “se alguém tivesse dito há quatro semanas que o mercado chinês iria tombar 20%, ninguém acreditava!”
Ora, a realidade aí está a sobrepor-se aos desejos de governantes incompetentes e fanáticos na forma como pretendem impor a sua ideologia.
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