A leitura semanal do «Expresso» tem sempre interesse não só pelas informações recolhidas mas, sobretudo, por aquelas que, implicitamente, se pretendem veicular num sentido favorável à direita dos interesses de que pinto balsemão faz parte.
Quando, em primeira página, se dá conta da intenção de cavaco silva intervir ativamente na composição do próximo governo, existe a intenção de criar a ideia de inevitabilidade do bloco central para a qual a grande maioria dos militantes socialistas não está de modo algum disponível para aceitar.
Durante alguns anos, cavaco pareceu pouco confortável num ideário neoliberal, que tendesse a reduzir ao máximo o papel do Estado na economia. Nesse sentido víamo-lo mais próximo da ideia de um salazarismo reciclado, que pretenderia dar aos privados tudo quanto pudessem gerir desde conquanto se revelassem obsequiosos para com o poder laranja, e mantendo uma presença forte no setor público para aí garantir uma corte igualmente domesticada de gente próxima de si. A imagem de um cavaco neoliberal só se veio a retocar nos anos mais recentes quando, apesar do desprezo que mutuamente ele e passos se votam, ambos se conjugaram na concretização do programa ideológico importado dos credores da dívida portuguesa.
Desconhecemos o que terá levado cavaco a abandonar uma farpela ideológica em proveito da mais recente, mas parece óbvia a intenção de tudo querer fazer para que ela não se esfarrape antes de concluir o seu mandato. Por isso, afiança o «Expresso», tudo irá fazer para conseguir um governo forte se não houver maioria. E a perspetiva do próprio semanário de balsemão é dificulta-la ao máximo com mensagens tão anódinas como a que leva bernardo ferrão a colocar António Costa na classificação negativa dos Altos e Baixos por considerar mal explicada a questão da mudança dos escalões do IRS. Será novidade para alguém que, depois deste governo ferir seriamente a progressividade dos impostos, quando vítor gaspar aproveitou para lançar um aumento brutal da carga fiscal, a obrigação de um novo governo socialista será a de recuperar essa ferramenta essencial para uma melhor redistribuição social dos rendimentos disponíveis?
É claro que a realidade vai dificultando a tarefa à direita quanto à sua imperiosa necessidade em evitar a formação de um governo socialista forte: os números do desemprego aí estão a desmentir fragorosamente a narrativa de sucesso das políticas implementadas. E também a forma como se encarrega de ir acumulando tiros nos pés com os elogios a loureiro ou a publicação de uma biografia transformada em matéria privilegiada para o exercício do corrosivo humor nacional.
Mas há que ser comedido no otimismo com que possamos encarar o que ocorrerá depois das legislativas de outubro: a intenção de minar completamente toda a administração pública estende-se a todos os aspetos da governação. É assim que pode ser entendida a grande rotação de diplomatas decidida pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, disposto a colocar nas embaixadas mais influentes os seus homens de confiança, aqueles que mais dificultarão a tarefa de António Costa em contribuir assertivamente para a mudança da cultura austericida ainda vigente na cena internacional...
Sem comentários:
Enviar um comentário