A entrevista concedida por Mário Centeno ao «Jornal de Negócios» veio ao encontro de alguns comentários surpreendentes de muitos socialistas, que lhe colam - muito apressadamente - a alcunha de neoliberal.
O que eu lhe tenho ouvido e lido não corresponde em nada a essa ideia, muito embora também não o situe numa esquerda revolucionária, que tudo ponha em causa - a forma de pagar a dívida, a pertença ao euro ou até à União Europeia ou a forma de organização económica da nossa sociedade.
Para quem anseia por ruturas claras seria bom que aferissem esses desejos pelas realidades que o governo e o povo grego têm padecido nas últimas semanas. Em vez de carregar a fundo no acelerador, arriscando um estampanço, não será melhor mostrar temperança e dar passos mais seguros e consistentes na direção pretendida?
É verdade que eu desejaria a Revolução Utópica para já, mas será ela assim viável? Em vez do passo atrás para dar dois em frente, como propunha Lenine, não ocorrerá precisamente o contrário?
A entrevista ao «Negócios» é lapidar numa conclusão: a resolução do impasse a que chegámos como consequência do austericídio dos últimos anos só pode ser conseguida com mais e melhor emprego. Só assim se poderá inverter a tendência da segurança Social tornada insustentável com as políticas deste governo.
Talvez Mário Centeno pudesse ser mais prudente, quando põe a nossa realidade neste dilema: ou crescemos ou temos de cortar pensões.
Uma frase assim assusta os socialistas e dá à direita argumentos falaciosos, porquanto logo trata de afiançar a intenção da esquerda em imitá-la nas intenções. Mas a questão é mesmo essa: o crescimento económico será a única solução para quebrar a condenação à pauperização ditada pelas instituições europeias.
As propostas de redução da TSU para quem trabalha - e não para os empregadores - , de estímulo ao consumo interno e de combate à precariedade vão todas no sentido do tal mais e melhor emprego.
Assustam-se alguns com a aparente facilitação do despedimento. Mas se um patrão for penalizado por uma excessiva rotatividade no mesmo posto de trabalho não se disporá a dissociar-se apenas dos que são manifestamente ineptos para nele serem mantidos?
Acredito que sim até pela experiência de, durante anos enquanto Diretor de uma grande empresa, ter contratado e despedido muitos trabalhadores. Todos eles cumpriam o período de experiência previsto na lei … mas os que mostravam competências e capacidades para aprender passavam ao quadro quando se esgotava o tempo de contratos a prazo. Por isso muitos não tardavam a contribuir para os números da natalidade do país, porquanto sentiam confiança bastante no futuro para investirem no crescimento da família (e é só com a segurança no emprego, que se resolve o problema demográfico por que estamos a passar!)
É ainda tabu para alguma esquerda maniqueísta o facto de existirem trabalhadores … e trabalhadores. Uns com o orgulho de serem ou se tornarem excelentes profissionais, os outros sem saberem, nem quererem saber e tendo raiva a quem sabe. Longe de ser uma amálgama uniforme, a força laboral é constituída de muitos indivíduos diferentes entre si. Muitos deles com bastante mais defeitos do que qualidades!
É por isso que convictamente marxista, não vejo nas teses de Mário Centeno o que entre em manifesta contradição com a necessidade de inverter decididamente a relação na distribuição de rendimentos entre o capital e o trabalho a nível nacional...
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