O que mais custa nesta altura é constatar que, até às eleições legislativas de outubro, estaremos condenados a esta apagada e vil tristeza, enquanto o mundo fervilha de acontecimentos reveladores de mudanças iminentes.
Nalguns locais ainda subsistem os que expressam a persistência de retrocessos ao direito dos povos à liberdade:
- para comemorar a data em que Hitler subiu ao poder, o partido de extrema-direita FPO organizou em Viena um concorrido baile de debutantes no Palácio de Inverno. Mas, a exemplo das contramanifestações contra os racistas de Dresden e outras cidades alemãs, também muitos vienenses foram manifestar-se no exterior daquele evento, que só espanta como ainda foi autorizado pela municipalidade vienense;
- no Cairo a polícia assassinou manifestantes, que se foram expressar na praça Tahrir, quando protestavam contra a traição aos ideais da revolução ali iniciada quatro anos atrás. Entre as vítimas desta jornada de luta conta-se Shaima al-Sabbagh, uma mulher laica e socialista, cujo assassinato foi captado pelas câmaras fotográficas e amplamente divulgado por todo o mundo. A exemplo do célebre miliciano captado pela Leica de Robert Capa, a militante egípcia irá converter-se num poderoso símbolo da luta contra a ditadura do general Sissi, cuja fúria repressora chega ao cúmulo de proibir a caricatura da sua figura, crime doravante punível com prisão por «insulto ao Egipto».
A par destes dois exemplos repugnantes podemos selecionar quatro de sinal bastante positivo:
- a subida de Hollande e de Valls nas sondagens, desmentindo o inevitável crepúsculo dos socialistas franceses. E certo que ambos beneficiam da forma irrepreensível como geriram os casos de terrorismo em Paris, mas só têm de afinar o passo e tudo fazer para frustrar quem já via a vitória de marine le pen como inevitável;
- a vitória dos curdos em Kobane, que mesmo periclitante - a cidade continua cercada por centenas de aldeias ainda dominadas pelo Daesh! - comprovou quão falsa era a imagem de invencibilidade alimentada por essa forma moderna de nazismo. O heroísmo dos peshmergas é uma fonte de inspiração para todos quantos se recusam a vergar à aparente inevitabilidade de uma «nova ordem» anunciada;
- a rutura evidenciada por Yanis Varoufakis quanto ao tipo de imagem, que associávamos às figuras dos ministros das Finanças. Rejeitando a pose do fato e gravata dos seus congéneres europeus, o novo ministro grego promete associar essa imagem moderna ao combate contra o discurso esgotado dos que ainda mandam no Eurogrupo. E, nessa renovada versão da luta sempiterna entre o velho e o novo, há milhões de europeus a desejarem que ele tenha sucesso a conseguir limpar as teias de aranha existentes nas cabeças dos que classificam as suas palavras de «contos para crianças»;
- embora a França discuta a legitimidade do comportamento da polícia de Nice, é positivo que um miúdo de oito anos tenha sido interrogado juntamente com o pai a propósito da apologia ao terrorismo por ele efetuada na escola. Quando ainda estão bem frescas as notícias de miúdos dessa idade a recusarem-se a respeitar o minuto de silêncio decretado pelas escolas para homenagear as vítimas dos atentados terroristas, não se compreende que a sociedade não se proteja contra a impunidade de uma cultura familiar onde cresce a mentalidade jihadista de amanhã.
Quer nas notícias de cunho negativo, quer nas mais animadoras, pressente-se pois que, atrás de tempos, tempos vêm, outros tempos estão aí a chegar...
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