Não tenho grandes dúvidas quanto aos objetivos pretendidos pela acusação ao decidir-se pela prisão preventiva de José Sócrates.
Aviltar, dobrar a vontade, quiçá despersonalizar quem lhes cai na alçada, são estratégias tradicionais dos torturadores, quando procuram encontrar respostas para as perguntas, que julgam poder vir a ser respondidas pelo torturado.
O mês e meio que já dura esta infâmia demonstra cada vez mais que o ministério público não tinha consigo provas fundamentadas para levar o antigo primeiro-ministro a julgamento. E as “notícias”, que vai soprando para os jornais, só confirmam a frustração que os invade. Senão veja-se a suposta indignação com que reagiram às respostas escritas ao questionário formulado pela TVI. É que fazendo jus à sua forte personalidade, a vítima da prepotência está longe de se deixar quebrar pela injustiça cometida.
Vale a pena por isso lembrar como esta reação de José Sócrates é bastante incomum, denotando a excecionalidade da sua pessoa.
Para ilustrar a facilidade com que as vítimas sucumbem frequentemente à estratégia dos seus algozes abordemos a experiência levada a cabo por Philip Zimbardo em 1971, na Universidade de Stanford, quando quis testar as modificações dos comportamentos dos indivíduos em situações carcerais. Para tal escolheu vinte e quatro homens, que dividiu aleatoriamente em dois grupos: doze dos participantes fariam de carcereiros e outros doze de prisioneiros.
À partida todos sabiam tratar-se de uma experiência científica com uma duração de quinze dias. Mas, embora estivesse proibida a violência física foi muito rápido o surgimento de manifestações de sadismo por quem fazia de guardas e de descaracterização pelos que lhes deveriam obedecer.
O próprio Philip Zimbardo, que decidira fazer o papel de superintendente da prisão, sentiu-se influenciado pelas circunstâncias e a adotar comportamentos distintos dos que julgaria possíveis em si. Por isso mesmo, assustado com as consequências da caixa de Pandora entreaberta, decidiu abortar a experiência ao fim de seis dias.
As questões levantadas por quanto acontecera nas caves do Departamento de Psicologia da universidade californiana continuam a ser perturbadoras: será que, por natureza, somos potencialmente torturadores, tão só sejamos sugestionados pelas circunstâncias em que nos vejamos colocados? Existirá uma malignidade recalcada dentro de cada um de nós?
Os psicólogos tendem a negar esta hipótese atribuindo o comportamento dos doze «carcereiros» a uma vulnerabilidade situacional, ou seja, a comportamentos induzidos pelas situações. São estas que tendem a determinar os comportamentos e os humores. E algumas organizações constituem ninhos maléficos onde a humilhação faz parte da cultura de quem as comanda.
Em séculos idos a Inquisição era um bom exemplo desse tipo de realidade. Por isso era extremamente eficaz em conseguir confissões e condenações sumárias das vítimas atiradas para as suas fogueiras. Mas teriam alguma ponta de verdade o reconhecimento de culpa por parte de quem se sujeitava à galeria dos horrores, que eram as salas de tortura dos inquisidores?
A prisão preventiva existe para quebrar o indivíduo e «facilitar-lhe» a convicção com que assuma as culpas, que lhe querem imputar. Não se trata de esclarecer a verdade, mas tão só de humilhar o prisioneiro, intentando destrui-lo psiquicamente,.
Se é essa a pretensão do ministério público, bem poderão esperar sentados, que José Sócrates jamais lhes fará esse favor...
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