Acabámos uma semana de muitas emoções por causa do sucedido em Paris. Nunca tinha passado tantas horas no canal France 24 para acompanhar, em primeira mão, a perseguição aos irmãos Kouachi, esperando um desiderato qualquer, que permitisse voltar às rotinas do dia-a-dia com a serenidade de quem não tem estímulo mais pertinente com que distribuir a atenção.
Não é que viesse a fazer diferença em relação ao conjunto de caricaturistas merecedores do nosso respeito e admiração, definitivamente silenciados, mas porque, a exemplo do sucedido com o 11 de setembro de 2001, adivinhavam-se sinais de mudança nos nossos destinos europeus.
E, agora, ao iniciar-se uma nova semana e ainda no rescaldo da megamanifestação de Paris, talvez me mostre demasiado otimista ao prever a possibilidade de tal demonstração de defesa de alguns dos princípios fundamentais da nossa civilização vir a criar uma dinâmica capaz de redirecionar muitos dos caminhos políticos e sociais, que parecíamos condenados a trilhar, para trilhos bem mais consistentes.
À partida os próximos tempos irão responder a duas questões basilares:
- o ataque ao «Charlie Hebdo» corresponde a um aumento significativo da atividade do terrorismo islâmico, ou, pelo contrário, a um dobre de finados da bárbara perversão prestes a ruir com sucessivas derrotas na Síria e no Iraque? Será possível que alguns dos seus alucinados se comecem a questionar sobre a sua vocação para mártires?
- terão razão os comentadores, que vendo marine le pen cavalgar oportunisticamente a onda de indignação causada por estes crimes, preveem uma vitória inevitável nas próximas presidenciais? Ou, pelo contrário, os últimos dias terão marcado a viragem nas percentagens de apreciação dos socialistas franceses, que se mostraram afinal tão eficientes a resolver este assunto em poucos dias?
Quero crer no crepúsculo acelerado do fanatismo islâmico, sobretudo se os países ocidentais investigarem a fundo o financiamento das atividades por ele alimentadas. Uma pressão persuasiva sobre os regimes do Qatar e da Arábia Saudita poderá ter resultados práticos muito palpáveis no futuro deste fenómeno repulsivo.
E também quero crer numa recuperação eleitoral de François Hollande e dos socialistas franceses de forma a impedirem o acesso da direita e da extrema-direita ao poder. É certo que Manuel Valls diz e faz coisas, que irritam quem do socialismo tem uma perspetiva mais conforme com a sua História, mas quem sabe se as fortes experiências desta semana o iluminem com doses acrescidas de sagacidade.
Mas esta semana também foi de clarificação entre dois campos inconciliáveis: os que se puseram incondicionalmente do lado do «Charlie Hebdo» e os que quiseram ser «originais», condenando-o em nome do «mau gosto» de algumas das suas caricaturas.
Pessoalmente e, desde o primeiro momento, revi-me na posição de Salman Rushdie, que disse: “Ponho-me do lado do Charlie Hebdo, como é dever de todos, para defender a arte da sátira, que foi desde sempre uma força da liberdade contra a tirania, desonestidade e estupidez”.
Aos detratores restou-me invetivá-los com o «Shame on you!»
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