1. Confesso que me irritam os jornalistas, que continuam a enfatizar a qualificação de “radical” ou de “extrema-esquerda” ao Syriza. Ainda se eles, dentro da mesma lógica, designassem o PSD e o CDS como “extrema-direita”, poderia aceitar, porque o que é o neoliberalismo senão uma forma “radical” de empurrar as classes médias para junto dos pobres em favor dos ricos?
Porque é que o Syriza é visto com a desconfiança de quem bombardeia o “sistema” e a direita, que nos desgoverna, não merece uma correspondente suspeição por destruir o direito de tantos em serem felizes?
Para mim é claro: a diferença entre a esquerda e a direita é a de estarem com aquela os que pretendem uma sociedade mais justa e igualitária, enquanto estão com a segunda os defensores dos interesses dos que se julgam com legitimidade para terem mais direitos do que todos os mais por serem detentores de bastante mais capital. Por isso mesmo, enquanto português sou socialista, mas poderia perfeitamente ser comunista ou bloquista, assim estivesse convencido em serem esses partidos os mais capazes para cumprirem o objetivo de uma melhor redistribuição de rendimentos. E, na Grécia, não teria qualquer dúvida em votar no Syriza, tendo em conta a rendição total do Pasok à cultura austeritária da direita e a habitual cristalização do Partido Comunista grego à mesma leitura labiríntica da realidade como o faz o de Jerónimo de Sousa entre nós.
2. Começa a ser confrangedora, nesse aspeto, a forma como um dos mais conhecidos deputados comunistas vai reagindo aos dilemas de cada momento. Falo de Miguel Tiago que, há uns meses atrás, a propósito do problema do aquecimento global o considerou uma mistificação capitalista para impedir o crescimento das economias de alguns países emergentes como a Rússia ou a Venezuela. Agora, perante a vitória do Syriza, escreveu no twitter que ela correspondeu ao efémero sucesso da burguesia grega, capaz de nele encontrar a expressão mais eficaz para iludir os operários gregos, que não tardarão a desiludir-se e a, finalmente, lançarem a revolução por que Tiago continua, e continuará indefinidamente, à espera.
3. Embora ainda falte saber se a vitória correspondeu, ou não, a uma maioria absoluta de deputados, o sucesso do Syriza já há dias, que aqui vinha sendo anunciado no blogue.
A minha confiança advinha de dois fatores principais: o primeiro tinha a ver com o que conhecia da mentalidade grega quando pretendem impor-lhes algo com demasiada veemência. Por isso estava-se mesmo a ver que as ameaças de merkel só contribuiriam para convencer para que lado penderiam os indecisos. E, depois, havia que não esquecer a segunda razão: é típico desses mesmos indecisos colarem-se aos anunciados vencedores no último momento só para terem o prazer pessoal de se sentirem também eles bem sucedidos em algo na vida.
4. Agora só falta fazer figas para que se cumpra o maior dos nossos desejos para os gregos: que Tsipras consiga um sucesso indubitável com o seu governo e ajude a Europa a virar resolutamente à esquerda contra os ideólogos, que nos quiseram impor a sua visão contrária aos interesses da maioria dos seus cidadãos.
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