Apesar de ser colunista do «Financial Times» - um daqueles jornais que não integram as minhas primeiras escolhas, quando se trata de manter-me informado -, Wolfgang Münchau é um dos analistas mais argutos da realidade europeia como temos oportunidade de verificar todas as semanas através dos seus artigos traduzidos pelo «Diário de Notícias».
O texto desta semana intitula-se “As grandes coligações da Europa permitiram o fortalecimento dos extremos” e constata como, quer na Áustria, quer na Alemanha, está a verificar-se a comprovação do que já há muito se sabe: uma coligação dos dois partidos mais ao centro do espetro político, suscita o crescimento inevitável dos que se situam nos extremos.
Nas eleições presidenciais austríacas da semana passada, nenhum dos candidatos, que passou à segunda volta, pertence aos partidos do governo, quer o de direita, quer o social-democrata. Agora a escolha far-se-á entre um neonazi e um militante dos Verdes. Esperemos que seja este último a conseguir a vitória, impedindo uma vez mais os nostálgicos do «Anschluss» de chegaram ao topo do poder.
Na Alemanha as sondagens indiciam algo de semelhante com a quebra significativa dos partidos de Angela Merkel e de Sigmar Gabriel e a subida do partido xenófobo, que acaba de decretar em Congresso que os muçulmanos não fazem parte da «cultura alemã».
Martin Niemöller, em 1933, escreveu o célebre poema em que primeiro levaram os judeus, depois os comunistas e a seguir os católicos, sem que o narrador se inquietasse já que não pertencia a nenhuma dessas confissões. Mas ao quarto dia calhou-lhe a ele ser levado.
Na Alemanha está a nascer algo assim: por agora excluem-se os muçulmanos. «Amanhã excluem-me a mim que sou social-democrata?», perguntava-se, indignada, uma militante da esquerda, quando entrevistada para a televisão.
Mas o artigo de Münchau é interessante, porque ainda não há muito tempo ouvíamos as teses peregrinas de Francisco Assis a defender uma grande coligação do PS com o PSD como solução para as «reformas» necessárias ao desenvolvimento do país. E Álvaro Beleza, outro notório tenor segurista não tem defendido outra coisa, ainda despeitado pela solução de governabilidade arranjada por António Costa, e o seu visível sucesso.
Para o jornalista alemão , dos dois partidos atualmente coligados no Bundestag “o declínio do SPD é o mais dramático. O mais antigo partido político da Alemanha caiu para 19,5% nas sondagens - em comparação com os 40,9% que obteve nas eleições de 1998. A entrada numa grande coligação como parceiro minoritário permitiu ao SPD ter uma influência muito acima do seu peso político. Unir-se ao governo de Merkel parecia a coisa mais pragmática a fazer. Agora, o partido está a pagar um preço elevado.
A sua liderança agarra-se à ideia de que só pode ganhar as eleições a partir do centro. Isso funcionou para anteriores líderes do SPD - Helmut Schmidt, na década de 1970, e Gerhard Schröder, entre 1998 e 2005. Mas deixa de ser verdade quando o parceiro de coligação já ocupa o terreno do centro. A estratégia inteligente para o partido seria a de nomear um líder de esquerda, alguém que esteja pronto para renunciar às limusinas ministeriais.”
Não é só em Portugal que se está a demonstrar a necessidade dos partidos socialistas e sociais-democratas europeus regressarem às suas matrizes de esquerda e fazerem da oposição às falsas respostas neoliberais a estratégia de redenção junto dos que devem mobilizar para um tipo de sociedade mais justa e fraterna.
António Costa já deu o exemplo. Agora haja quem tenha a coragem de o imitar um pouco por toda a Europa...
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