Antecipando o Congresso do Partido Socialista do próximo fim-de-semana a jornalista do «Público» São José de Almeida foi ouvir vários testemunhos dos que militam no partido ou o olham de fora com a perspetiva analista de quem está à direita (Rui Ramos) ou à esquerda (Pedro Adão e Silva).
A questão subjacente que se coloca nessa leitura é esta: estamos perante o mesmo Partido de Mário Soares, António Guterres ou José Sócrates, ou, pelo contrário, António Costa personifica uma rutura com o passado e algo de novo na sua identidade?
O primeiro-ministro não assume essa descontinuidade, considerando que “a síntese de António Guterres há 20 anos é a que todos os líderes do PS têm seguido, moldada pela personalidade de cada um e pelas conjunturas, mas a matriz é essa.”
Por seu lado Graça Fonseca, secretária de Estado da Modernização Administrativa, parecendo dizer o mesmo - “há uma camada identitária do PS que mudou pouco em quatro décadas, o PS tem um fundo de valores que são estruturais e permanecem, são eles a defesa da liberdade, da igualdade de oportunidades, dos serviços públicos” - toca no verdadeiro busílis da questão: “os partidos também sofrem o impacto da globalização, das conjunturas.”
Foram de facto as mudanças verificadas externamente, que estimularam a verificada no Partido Socialista: o fracasso da Terceira Via, que sustentara ideologicamente os governos de Guterres e de Sócrates , conduziu à crise das sociais-democracias, com a maior parte dos partidos europeus dessa matriz ainda a não terem conseguido livrar-se dessa ilusão apesar de verem os eleitorados extremarem-se, abandonando o centro de que eles se arrogavam fiéis representantes.
É o que constata Pedro Adão e Silva: “o arco da governação existia porque havia eleitorado do centro”, o qual está “em erosão por toda a Europa, afastou-se e a única forma de reconstruir um espaço de compromisso é através da cooptação dos extremos”.
Foi o entendimento de tal situação, que terá levado António Costa a entrar em rutura com o beco sem saída para onde Seguro conduzia o partido. Não colocando em causa o memorando da troika e jamais assumindo um discurso de rutura com a austeridade, o anterior secretário-geral não intuiu o quão obsoleto estava já a ser o seu posicionamento político. Algo que continua a ser replicado por um Francisco Assis, como se pode ler nas entrevistas por ele dadas esta semana ao «Diário de Notícias» e ao «Expresso», em que é manifesta a vontade de devolver o PS à tal condição de charneira sem entender que quem nela se reconheceria já lá não está.
O Congresso da próxima semana será, pois, o da consagração do Partido Socialista como o líder do espaço da esquerda plural em Portugal, de acordo com algumas das principais características a ele trazidas pela renovação geracional, como nele deteta o mesmo Pedro Adão e Silva: “um europessimismo e um euroceticismo camuflado”.
Nos próximos anos, ou as esquerdas mantém-se inteligentemente unidas nos mínimos denominadores comuns, que segregam a direita para franjas sociais e políticas inoperantes, ou permitirão, que ela renasça qual fénix moribunda e volte a revelar a sanha predadora, que tem demonstrado para com o que ainda sobrevive como classe média.
Esperemos, igualmente, que os partidos socialistas e sociais-democratas europeus aprendam alguma coisa com o pioneirismo português e consigam voltar a ter, no plano europeu, e até mundial (vide as propostas de Bernie Sanders nos Estados Unidos) a relevância merecida.
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