terça-feira, 5 de abril de 2016

O abanar de uns papéis no Panamá

Confirma-se a demissão do primeiro-ministro da Islândia e o vice-presidente brasileiro desfilia-se à pressa do seu partido na expectativa de ainda conseguir ocupar o lugar de Dilma antes de ver o presidente da Câmara de Deputados preso por corrupção e fuga de capitais gorando-se assim, sem glória, a tentativa golpista de tirar o PT da governação brasileira.
Os Panama papers estão a ter essa virtualidade: numa realidade pantanosa, o mero agitar das águas já está a suscitar alguns efeitos.
Não são ainda os pretendidos - o fim dos paraísos fiscais, por onde circula hoje metade do PIB mundial - mas Manuel Carvalho prevê no «Público», que este cancro “sai definitivamente da esfera mansa do poder (e dos partidos da esquerda, que o têm ajudado a manter na atualidade) e instala-se na preocupação geral”. Porque se o Estado Social tem sido sucessivamente reduzido no alcance das suas benesses à universalidade dos cidadãos, é porque a fuga aos impostos atingiu tal dimensão que, só na Europa, calcula-se que corresponda a  2000 euros/ ano por cada um dos 500 milhões de cidadãos da União.
Nos últimos anos os casos sucessivos ocorridos com os bancos, que causaram tanto prejuízo aos bolsos dos portugueses, tiveram em comum a mesma receita: a evasão fiscal, o branqueamento de capitais, a ocultação de operações financeiras nos balanços dos bancos e a utilização de refúgios fiscais para garantir o anonimato de transações. Foi para aí que se evaporaram as comissões com as vendas dos submarinos e era num deles que estava a célebre coleção Miró.
Com o cinismo próprio de quem conhece bem a realidade mais sórdida de quanto é agora denunciado, um dos mais altos responsáveis da City afirmou que muitos políticos têm a ilusão de que, de facto, governam os seus países, mas realmente eles apenas governam dentro dos limites que lhes são impostos pelo sistema financeiro global.”
Esperemos que António Costa veja facilitado o seu trabalho, quando se identificarem os portugueses que se serviram da Mossak Fonseca para fugirem aos impostos e tais verbas venham a ser recuperadas pela Autoridade Tributária. E que a Frente Nacional de Marine Le Pen sofra as consequências de financiar as suas campanhas de ódio com verbas ilegitimamente depositadas nesses paraísos fiscais.
Mas convenhamos que, tratando-se apenas da quarta maior empresa do Panamá dedicada a esta atividade, e havendo mais umas dezenas de outros países ou territórios onde as sociedades offshore proliferam, dá para perceber que estamos a ver escalpelizada uma pequena gota de agua num vasto oceano de corrupção e de crime organizado. Trata-se, no fundo, de um retrato sem maquilhagem do que de pior tem o capitalismos selvagem.




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