A um ano das eleições presidenciais francesas, o Partido Socialista caminha para uma humilhante derrota, por François Hollande e Manuel Valls terem dele feito o exato contrário do que deveria ser: uma organização política sem ideologia. Ou, melhor dizendo: com aquele tipo de ideologia muito típica da direita em que importam mais os resultados do que os princípios. O pior é que, esquecidos estes, também aqueles estão longe de serem brilhantes.
Não deixa de ser paradoxal que, no país onde se sucederam os mais brilhantes filósofos sobre a questão da organização social - de Montaigne a Rousseau, de Voltaire a Descartes, culminando em Sartre ou em Camus - a esquerda francesa se veja acometida de tal preguiça mental, que exaspera os mais inconformados dos seus simpatizantes.
O Partido Socialista francês (PSF) é o exemplo lapidar de um tipo de estratégia escolhida pelo movimento socialista e social-democrata internacional em como, perante a crise de 2008, não valeria a pena contrariar a força crescente da direita aglomerada no Partido Popular Europeu (PPE), preferindo-se colher umas lentilhas juntando-se a ela - e foi isso que fez o SPD alemão! - ou adotando-lhe a cartilha austeritária, como está a fazer o PSF. No caso deste último até se foi buscar, como estrela ministerial para a Economia, um neoliberal chamado Emmanuel Macron, que não tardou a criar um novo Partido político, tão acarinhado pela direita, desejosa de a si o atrair.
Há um vazio ideológico, que não dissocia os socialistas das falsas propostas da direita ou da extrema-direita com a diferença de nem sequer sugerir melhorias na qualidade de vida dos que irão votar.
Não é difícil adivinhar o aggiornamento dos setores mais à direita do atual PSF com o provável vencedor das próximas presidenciais, Alain Juppé, relegando o partido de Mitterrand para um vergonhoso resultado pasokizado. Talvez o PSF se liberte, enfim, dos que, a exemplo do primeiro-ministro Valls, se confessam incomodados com a designação de «Socialista» para a identificação do seu partido.
Era essa mesma pasokização que António José Seguro propunha quando era secretário-geral do PS, ao defender um desses dois caminhos segundo o resultado eleitoral, que obtivesse nas legislativas de 2015. E Francisco Assis ainda teimou até há pouco tempo ser essa a melhor solução. Ou governar como o faria a direita, ou aliar-se a ela para melhor lhe caucionar as políticas contra os interesses da grande maioria dos eleitores.
Felizmente que a opção de António Costa relativamente ao acordo com a demais esquerda parlamentar demonstrou a visão de se querer ir por outra direção, afinal aquela que verdadeiramente constitui a matriz ideológica do Partido Socialista português. Mas, não tenhamos grandes dúvidas em como essa reorientação estratégica não é acompanhada por amplos setores do Partido, ainda demasiado agarrados à conjuntura anterior para se conseguirem adaptar ao Tempo Novo.
Hoje é necessário que a crise de representação política demonstrada na crescente abstenção e até rejeição da política, seja combatida com novas propostas, que tenham em conta muitos dos principais desafios que nos condicionam: os bloqueios europeus, a questão dos refugiados, a importância da regulação financeira como forma de combater as metodologias denunciadas nos «Panama Papers» e a transformação acelerada da nossa sociedade e da economia suscitada pela revolução informática. Exemplos concretos de questões para as quais importa encontrar respostas claras e consistentes em vez das banais generalizações que, comummente ouvimos a seu respeito.
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