Às vezes é preferível olharmos para a realidade externa com filtros diferentes dos que nos dão conta ser o Brexit ou a Conferência dos G20 os assuntos mais importantes do momento. Porque se estes casos em concreto têm incidência no curto prazo e num alcance limitado, outros há, menos mediáticos, que influenciarão significativamente o futuro dos nossos filhos e netos.
Leio, por exemplo, que o Quénia está a despovoar-se de animais selvagens, porque a pressão demográfica é tal, que pastores e agricultores exploraram a terra e os recursos das áreas protegidas. O resultado é envenenarem leões, porque alimentam-se do gado estacionado nos territórios, que costumavam ser exclusivamente seus, ou elefantes, porque, nos seus trajetos ancestrais, passam por terrenos cultivados, destruindo-lhes parte das colheitas.
Muito embora seja assunto eclipsado do material noticioso quotidiano, a Terra não suporta tanta população, sendo urgentes as medidas tendentes a controlá-la, senão mesmo a diminui-la. É estúpida, para não dizer criminosa, a vulgata religiosa, que manda as famílias escusarem-se aos métodos anticoncecionais para melhor cumprirem as vontades divinas. A comunidade internacional deveria obrigar-se a investir seriamente na educação das populações, impondo conceitos racionais como os da igualdade entre homens e mulheres e a da injustificada multiplicação da espécie. Mesmo contrariando valores ancestrais que, como todas as tradições devem passar pelo crivo do que deverão ser os mais avançados padrões civilizacionais. Mas é estulta a ilusão de que isso possa suceder no contexto do sistema económico, que nos oprime: o capitalismo selvagem alimenta-se das desigualdades, da ignorância, do preconceito. Como têm alertado tantos cientistas a sustentabilidade do planeta não é compatível com o tipo de organização económica baseado na prevalência do mercado. E isso está bem à vista no atual movimento contestatário em França, no qual são os mais pobres a renunciarem à alternativa de um outro tipo de sociedade, para defenderem a manutenção daquela que continua a aprofundar os desequilíbrios ecológicos do planeta. Quão distantes estamos de conseguir alterar suficientemente as mentes para que vejam como imperiosa a mudança de rumo da nossa civilização.
O que o cientista chinês anunciou esta semana relativamente ao nascimento de crianças geneticamente modificadas é só mais um exemplo de como trilhamos caminhos perigosos, que nos afastam dos desejáveis. A eugenia nazi vê-se facilitada por uma tecnologia que, a prazo, poderá assegurar a criação de élites, que se considerem como «os novos arianos».
O caso só vem demonstrar a imperiosidade de impor o primado da Lei sobre a desregulamentada gestão das sociedades, que tudo permite a quem tem meios para concentrar em si os recursos disponíveis, condenando a grande maioria à condição de párias sem futuro.
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