domingo, 25 de novembro de 2018

Num mundo ideal


Era tão bom que o mundo fosse tão diferente do que é! Há sempre um hiato significativo entre as realidades e o que desejamos, que elas configurassem! Mesmo que, às vezes - e a formação da atual maioria parlamentar há três anos, ou a manhã clara e limpa de 1974 são disso exemplo! - tenham correspondido à quase sintonia dos sonhos com o então vivido.
Num mundo ideal o Bloco de Esquerda não precisaria de se valer de críticas ao Partido Socialista para conseguir os votos necessários e impor-se-lhe como parceiro do governo. Ora, António Costa tem toda a razão, quando alerta a pouca inteligência das esquerdas se decidirem digladiarem-se entre si no ano eleitoral que se aproxima.
Num mundo ideal essas mesmas esquerdas parlamentares, cada vez mais tentadas a questionarem as convergências destes três anos, não seriam tão ineptas que decidiram cortes de 140 milhões de euros às eólicas para os reverterem a favor dos consumidores, sem ponderarem que, afinal, esse dinheiro terá de ser devolvido a Bruxelas, donde terão vindo na forma de subsídios, agora por elas considerados ilegítimos.
Num mundo ideal os partidos das direitas não andariam tão à deriva, tão sem rumo, que não lhes resta alternativa senão a de mentirem insidiosamente. É o que continua a fazer Cristas, abespinhada pela medalha de ouro de despesista ofertada por António Costa, e daí lhe sair a velha falácia da responsabilidade do governo de Sócrates na dita bancarrota, como se não tivesse havido a crise dos subprimes, a falência da Lehman Brothers ou as indefinições da Comissão Europeia do arrivista Barroso, ora mandando gastar dinheiro à fartazana, ora impondo cortes brutais logo a seguir.
Num mundo ideal os mais de 334 mil desempregados seriam ainda menos, apesar de nunca terem sido tão poucos nos últimos cinco anos, e a metade deles que sobrevive, sabe-se lá como, sem quaisquer apoios do Estado, recebê-los-iam para se livrarem de parte substantiva das suas angústias.
Num mundo ideal a empresa de estiva turca, que mantém os seus trabalhadores numa precariedade revoltante, já teria perdido a concessão no porto de Setúbal sob o argumento de não contar com efetivos bastantes para cumprir os compromissos a que se vinculou, sendo substituída por outra com melhores práticas do que as de uberizarem quem exploram sem escrúpulo.
Os exemplos poderiam prosseguir por muitas mais linhas, mas fica a ideia geral: a realidade dissocia-se tanto mais do que desejamos quanto mais desistirmos de lutar por essa sintonia. O compromisso com a exigência de melhor futuro reside no que fazemos no dia-a-dia. 

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