Sejam os jornais, sejam as televisões - e admito que o mesmo aconteça com as rádios! - verifica-se um sério atarantamento dos jornalistas, que se sabem obrigados a respeitar os ditames de quem lhes paga os ordenados, mas confirmam, dia a dia, como as suas peças merecem progressiva indiferença em quem as lê ou vê. Sobretudo, porque se as críticas eram outrora cingidas à oralidade dos espaços públicos, agora ficam registadas em reações virais nas redes sociais. Razão porque vêm reagindo com particular sanha contra quem delas se serve para lhes denunciar a incompetência ou a submissão a interesses, que não os devidos à luz do seu código deontológico.
Poderíamos ter tido alguma expetativa face à assumpção de muitos dos problemas hoje verificáveis na imprensa tradicional no recente Congresso dos Jornalistas. Nalgumas intervenções estiveram em causa a exagerada filiação aos interesses dos proprietários desses meios de comunicação e a incapacidade em prender a atenção de leitores e espectadores perante a mudança de paradigmas da sociedade contemporânea. Porém, se a consciência existe quanto a viver-se um fim de ciclo de contornos imprevisíveis - mas notícias como a da colocação no mercado das revistas do grupo Impresa vão-no configurando! - não se constatam grandes diferenças em relação ao já visto e conhecido. Por isso as semanas mais recentes foram as da exploração até à náusea de reportagens sobre incêndios, mesmo sabendo-se quanto elas poderiam desencadear mecanismos de mimetismo em quem alimentava no íntimo uma propensão pirómana. Embora muitos dos responsáveis pela edição de jornais e telejornais possuam formação bastante para saber quanto o sucesso de um negócio está dependente da sua diferenciação, todos se limitaram ao exercício preguiçoso de se repetirem uns aos outros, sem haver quem arriscasse a autocrítica quanto ao sentido do que iam produzindo.
Quem gostaria de encontrar como diferença a objetividade, o aprofundamento das questões, a racionalidade, só encontrou a exploração das emoções, como se o sucesso da informação dependesse da satisfação das tendências voyeuristas dos seus consumidores.
Agora, que as chuvas chegaram e o futebol não basta para preencher cabeçalhos vistosos, o tema que se cria é o das visitas de altos quadros da Administração Pública à China ou aos EUA convidados por empresas multinacionais com interesses na venda dos seus produtos ou serviços. Merece o destaque que está a ter ou volta a ser a tendência para explorar o lado mais sombrio do imaginário coletivo, mormente o sentimento de inveja por uns terem acesso a tanto e os outros a tão pouco?
É essa a notícia que merece prender a nossa atenção ou não tem outra relevância a prometida melhoria da qualidade de vida da maioria dos portugueses à conta da revisão das tabelas do IRS? Ou não será mais relevante a forte probabilidade de redução efetiva da dívida soberana à conta do pagamento a ser feito ao FMI dentro de poucas semanas?
Se os media pretendessem explorar o que de maligno subsiste na sociedade portuguesa poderiam sempre indignar-se por, mais uma vez, ser adiado o prazo para o Ministério Público confessar-se quanto a ter ou não uma prova, uma provazinha que seja, para justificar a perseguição a que tem submetido José Sócrates. Mas, nesse aspeto, os jornalistas em causa seriam obrigados a dissociar-se do papel que lhes tem cabido de servirem de idiotas úteis a quem pretendeu, desde início, criar um caso judiciário mesmo só tendo por argumento o seu preconceito ou desconfiança.
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