A propósito do texto "As favas que ainda estão afinal por contar" Jaime Santos contesta o entusiasmo ali explicito pela possibilidade de Jeremy Corbyn conseguir um resultado eleitoral muito acima do que lhe profetizavam os comentadores, que dominam o nosso espaço mediático.
Diz aquele nosso leitor:
“Sim, mas mesmo a pasokização dos Partidos de Esquerda Social-Democrata, muitos deles convertidos ao neoliberalismo, não altera o essencial, que é, ou você governa com o que tem, ou tarde ou cedo vai de mão estendida ao FMI, como já aconteceu antes entre nós, aliás.
Pode prometer-se tudo a toda a gente, mas para entradas de leão com saídas de Syriza, prefiro a minha 'Esquerda' moderada e pasokizada, ou mesmo a Direita Liberal, a todos aqueles que querem transformar os diferentes Países Europeus em diferentes versões da Venezuela sem o petróleo.
Como disse acima, o programa de Corbyn tem um pequeno problema. Ao revelar-se incapaz de recolher os recursos que necessita para fazer o que pretende, ou vai acabar a defraudar os eleitores, ou o 'Socialismo' acaba, como dizia Thatcher, quando acabar o dinheiro dos outros (dos credores). Podem ganhar-se mil eleições recorrendo à demagogia, que o resultado final é sempre o mesmo... A não ser que, claro, como Maduro, depois se queira acabar com as eleições…”
Como quase sempre acontece discordo completamente da crítica, porque assenta neste pressuposto: ou aceitamos a TINA, também ela uma tese de Margaret Thatcher, ou caímos no caos venezuelano.
A realidade é bem mais rica do que este tudo ou nada em que Jaime Santos fundamenta a antipatia pelas propostas de Jeremy Corbyn. Tanto mais que esquece um dado importante: o atual líder trabalhista britânico tem uma formação política, que os militares venezuelanos não possuíam, quando secundaram Chavez e se apossaram dos lugares-chave do regime. E que nunca quiseram vir a ter, porque se contentaram em encontrar a forma de segurar o poder e dele colher as mordomias subsequentes.
Tratar-se-ia, à data do 25 de abril, de equiparar os conhecimentos e a preparação para a governação entre Mário Soares e Otelo Saraiva de Carvalho. Uma comparação, que não fazia qualquer sentido, por muito que o autor de «Alvorada em Abril» pudesse sonhar-se como réplica potencial do seu admirado Fidel. Daí que os efeitos da governação de uns e de outros nunca possam ser postos nos pratos da mesma balança.
Jaime Santos contesta as propostas económicas dos trabalhistas ingleses, nomeadamente no que têm a ver com as renacionalizações que tanto andam a incomodar as lideranças europeias. Imagine-se que elas vêm a revelar-se bem sucedidas, com Corbyn a imitar Centeno na lista dos governantes por quem poucos se dispunham a apostar um tostão furado. Seria a hecatombe de mais uma máxima de entre as muitas que têm caído nos últimos anos a propósito das vantagens da propriedade privada sobre o setor público da economia.
O que me tem sempre surpreendido nas contestações de Jaime Santos é a sua posição de princípio em como se algo corre mal - mormente todas as falhadas experiências socialistas até aqui rastreadas! - assim sempre ocorrerá. E continuando a apostar em cavalos completamente esgotados - a social-democracia ou a direita liberal - que fizeram sentido em fase recuada do capitalismo, mas não têm qualquer cabimento no atual, financeirizado, plutocrático, impeditivo de manter expectativas quanto ao funcionamento eficiente do elevador social - tenta diminuir o corpo teórico, que fundamenta a única alternativa justa para gerir um planeta onde resta pouco tempo para o manter habitável. As exageradas desigualdades na distribuição de rendimentos, o esgotamento avassalador dos recursos naturais e assustadora degradação dos ecossistemas em que vivemos não aconselham a perdurabilidade do laissez faire, laissez passer - que é fórmula ainda atual para as intenções desreguladoras dos mercados.
E que o nosso crítico descanse: a sociedade socialista pela qual muitos almejam nada tem a ver com as que gosta de citar como exemplos fracassados das tentativas para a alcançar. Será que desconhece a capacidade inesgotável de aprendizagem da sociedade humana com os seus erros? Veja como as próprias esquerdas portuguesas conseguiram, enfim, dissociar-se do tradicional fratricídio com que costumavam abrir as portas de par em par, para que as direitas desgovernassem!
A nossa espécie ainda será muito bem capaz de o surpreender quanto à sua capacidade de renegar as tentações bárbaras e tornar-se em algo de muito decente. Eis uma Utopia, que ainda espero poder testemunhar, senão enquanto realidade sustentada, pelo menos enquanto expetativa iminentemente concretizável.
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