No regresso a este cantinho à beira-mar plantado encontro as coisas tal qual estavam antes desta ausência: as notícias abonatórias da ação deste governo sucedem-se umas às outras enquanto a oposição vai-se revelando patética na sugestão de existir um país muito diferente daquele que a maioria dos cidadãos sente. O hiato entre a realidade e o cenário de ficção descrito por Passos Coelho e Assunção Cristas é tal que somos levados a questionarmo-nos se não existirá algum distúrbio psiquiátrico, ou pelo menos oftalmológico, a condicionar a perspetiva de um e de outro.
Por isso os telejornais vão-se enchendo de notícias típicas de tabloides, ora envolvendo sarampo, cães perigosos e, agora, os primeiros afogados nas praias de norte a sul. Sem notícias palpitantes que, politicamente, captem audiências e rentabilizem os investimentos publicitários, as televisões apelam para o que de mais primário existe na mente dos telespectadores: sangue, morte, crime...
Na política não é grande o sucesso dos telejornalistas em cachas palpitantes: exploraram o mais que puderam a questão da tolerância de ponto do próximo dia 12 de maio sabendo, à partida, que se o governo a desse era notícia pela contradição com a defesa da laicidade pela esquerda mas, se não a desse, também se poderia intrigar por via do escarcéu lançado pelas direitas.
O Conselho de Finanças Públicas é outro assunto que se esgota pela recusa de António Costa em fazer-se interlocutor dos que o questionam sobre a recusa de uma fanática neoliberal.
Se calhar melhor atenção ganhariam se fizessem notícias sobre a origem desse órgão nada independente, que custa muito dinheiro aos contribuintes para emitir pareceres invariavelmente errados.
Será que os espectadores não ficariam muito mais agarrados aos ecrãs se lhes lembrassem como esse órgão surgiu como chantagem do PSD a José Sócrates para que deixasse passar o Orçamento de 2010? E que a suposta independência dificilmente se comprovaria no facto de, sem outra solução, o então primeiro-ministro socialista ter aceite os nomes que a então oposição de direita lhe impôs, com Teodora Cardoso à cabeça.
O mesmo sucedeu, aliás, com o Banco de Portugal onde o então governo socialista foi obrigado a, perante as pressões de Cavaco Silva e dos partidos da direita, a nomear Carlos Costa para um cargo onde tem tido o desempenho que sabemos. Que independência é a desse «governador», que Passos Coelho reconfirmou para novo mandato, sabendo-o cúmplice certo da contínua sabotagem das políticas socialistas?
É certo que deixariam de cumprir o papel ideológico para que estão fadadas, mas as televisões poderiam recolher maiores audiências se fossem honestas nas abordagens a essas e outras questões, que, nas versões marteladas até à náusea, já não merecem qualquer crédito.
Há uma alternativa que tomam então em desespero de causa, quando, a nível interno, não encontram argumentos para contrariar o evidente apoio de que goza a atual maioria parlamentar: a política externa. Daí que queiram associar Mélanchon a Marine Le Pen como se fossem faces opostas da mesma moeda e conotando o primeiro com as forças mais radicais da maioria parlamentar. E não desmentem a falácia, mesmo quando Mélanchon dá indicações precisas de nenhum voto dos que o apoiaram vir a transferir-se para a herdeira do fascismo lepeniano. Também aí a verdade vai cerceando credibilidade a quem nada tem feito para a recuperar. Mas esse é outro objetivo tangível dos donos das televisões e dos jornais: se não conseguem virar a opinião pública contra o governo, tentam distrai-la tanto quanto possível com futebóis, crimes e outros assuntos que tais. Esperançados que, em melhor altura para os seus interesses, essa passividade se revele mais permeável para o próximo dom sebastião, que Miguel Relvas ou Dias Loureiro já andarão a preparar para novo ciclo de arriscar a conquista do tão invejado “pote”.
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