Quem me lê sabe bem o quanto antipatizo com o atual inquilino do Palácio de Belém. Não tanto quanto execrei o antecessor, mas ninguém espere ver-me alguma vez juntar ao coro dos seus aduladores. Daí que passe ao lado do personagem, sempre que possível, só a ele voltando quando as suas asneiras me tiram do sério. Como sucedeu esta manhã, tão só procurei nos noticiários as reações dos suspeitos do costume à notícia da posição da Comissão Europeia a respeito da saída de Portugal da lista negra dos países sujeitos a constrangimentos por apresentarem défices excessivos.
Que Passos Coelho apareça a exigir que o governo não atue de acordo com calculismos eleitorais já nem escandaliza. A desvergonha de quem andou todo o ano de 2015 a empurrar para debaixo do tapete todas as situações comprometedoras no sistema bancário para chegar às eleições com indicadores manipulados, mas tão bons quanto o possível, já não espanta. Homem sem qualidades, Passos vai confirmando a sua condição de quem tem quase todos os defeitos.
Que José Gomes Ferreira quase tenha de morder a língua para dizer bem deste sucesso, mesmo deixando implícitas as críticas do costume quanto à falta de «reformas estruturais» - que na sua enviesada mente só quer dizer cortes e mais cortes a reformados e funcionários públicos - já se desconta por conta de um tonto, que chegou a publicar um programa de governo na mira de cavalgar alguma onda populista, e se vai conformando com o papel de entertainer num regular programa de anedotas às quartas-feiras à noite.
Que Bernardo Ferrão mantenha aquele esforço de parecer mais papista que o Papa na esperança de vir a colher do patrão as prebendas por agora usufruídas por Ricardo Costa, também está na linha do que já dele sabemos: é o típico arrivista capaz de tudo fazer por um lugarzinho na ribalta.
A quem não posso desculpar é a Marcelo por ter inteligência suficiente para saber o que está efetivamente a fazer e cujos parabéns a Passos Coelho pela decisão de Bruxelas soa a indignidade, que os portugueses não merecem.
Porque, na realidade, que fez o antigo primeiro-ministro para merecer a distinção? Que sentido faz secundar-lhe o argumento segundo o qual os êxitos deste governo, dele são, enquanto o que eventualmente corresse mal, só a António Costa seriam devidos?
Julgará Marcelo que os portugueses são lorpas e não associam este êxito ao governo socialista e à maioria parlamentar que o apoia? Então, porque insiste em considerar Passos Coelho corresponsável pelo que tem sido obra exclusiva de quem mudou o paradigma da governabilidade em novembro de 2015?
Se Marcelo quer dar aos parabéns a quem os merece antes dessa data, atribua-os ao Tribunal Constitucional cujas decisões impediram o governo anterior de implementar medidas de austeridade ainda mais gravosas. A relativa viragem da curva negativa do rendimento médio dos portugueses no final do governo de Passos Coelho explica-se pela conjugação de dois fatores: o tal calculismo eleitoral que ele diz existir nas esquerdas, mas só faz sentido em quem por si julga os demais, e por esse travão aos cortes das pensões, que logo possibilitou um pálido recobro no então moribundo consumo interno.
Ao atribuir méritos a quem os não merece, Marcelo vai comprovando o que dele sabemos: tão só as circunstâncias lho permitam e ele revelará o carácter faccioso, que lhe vai na alma.
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