Amiúde tenho aqui referenciado o contributo de Jaime Santos para o enriquecimento do blogue «Ventos Semeados», comentando com fundamentação consistente, e como resultado de profunda reflexão, os temas aqui tratados. Por isso considero necessário partilhar esses textos com um universo mais alargado de leitores não os deixando cingidos às caixas de comentários dos posts a que respeitam.
Nos últimos dias ele reagiu a dois textos. O primeiro tinha a ver com o paradoxo de afluxos sucessivos de refugiados propiciarem - pelas reações de medo nas franjas das populações mais facilmente manipuláveis pelos discursos xenófobos da mais repulsiva demagogia - o crescimento da extrema-direita.
No essencial concordo totalmente com Jaime Santos, corroborando a ideia de ser necessário que as esquerdas saibam agir preventivamente sobre esses estratos sociais em vez de irem depois atrás da recuperação dos prejuízos suscitados por tais discursos.
Eis, pois, o texto de Jaime Santos:
“Qualquer pessoa minimamente responsável tem que defender algum controle da imigração, no limite a reação dos eleitores ou força os governos a mudar de política, ou muda os governos e poderemos acabar com a Extrema-Direita no poder. Mas convinha lembrar que a imigração tem um efeito positivo na Economia na generalidade dos Países e que os Países mais capazes e resilientes são aqueles que melhor aproveitam os talentos dos que aí procuram residência ou abrigo (vide os EUA e o Canadá).
Importa claro integrar os imigrantes e dispor de políticas que compensem os efeitos mais perniciosos da imigração, mormente a pressão sobre os serviços públicos. E também, como se vê no RU, são os mais qualificados que agora se interrogam e recusam estudar ou trabalhar aí, não se pode ser acolhedor de maneira seletiva. Se May e a classe média e baixa inglesas querem ficar sozinhos, pois que fiquem, tenho pena porque adoro a Inglaterra, mas 'good riddance'.
Agora, por um lado Portugal deve pensar nos seus próprios emigrantes e não ser hipócrita, até porque ficaríamos em sérios sarilhos se de repente Angola, a Venezuela, o Brasil, etc, retaliassem a um eventual fechamento da nossa sociedade e acabássemos por ter que receber meio milhão ou mais de pessoas sem emprego. Por outro lado, se o que nos assusta é a convivência com o Islão, faço notar que a nossa comunidade muçulmana conta com algumas dezenas de milhar de pessoas que vivem em Portugal sem problemas e aqui prosperam e que temos pois excelentes maneiras de estabelecer pontes com os recém-chegados (no caso dos sírios muitos até são bem qualificados)...
Finalmente, os Chineses têm investido em Portugal porque há oportunidades, mas também porque sabemos recebê-los bem. Carlos Monjardino dizia que eles se sentem genuinamente reconhecidos aos Portugueses pela deferência com que são tratados... Sem querer pintar um quadro demasiado rosa, há que aproveitar o fechamento de outras sociedades europeias e lucrar com isso... “
Já no segundo texto vem de novo a talhe de foice a grande divergência entre o meu pensamento e o de Jaime Santos a propósito do legado deixado pelo governo de José Sócrates: enquanto ele mantém uma visão essencialmente crítica, eu mantenho a defesa das políticas do antigo primeiro-ministro por tudo quanto fez em prol da criação de um país mais desenvolvido com o imenso legado de Mariano Gago na investigação e ciência, com o Simplex, com as Novas Oportunidades, com a aposta nas energias renováveis, com a requalificação do parque escolar e muitas outras concretizações que, se continuadas pelo governo seguinte, nos teriam deixado mais avançados do que estamos para o cumprimento das ambições da generalidade dos portugueses quanto ao tipo de país em que querem viver.
Terá sido José Sócrates infeliz ao ver-lhe descambar em cima a crise financeira subsequente à falência da Lehman Brothers? Claro que o foi, tendo sido essa a razão para a impossibilidade de prosseguir um rumo, que tudo indiciava ser bem sucedido.
Terá tido em Teixeira dos Santos um ministro das Finanças imprudente, quando acedeu a cumprir as orientações da Comissão Europeia no sentido de investir urgentemente o mais que se pudesse para corresponder à recessão então sentida como algo a evitar a todo o custo? Sim, mas as culpas, a emiti-las, só têm um réu indubitável: Durão Barroso que, ora encabeçou essa urgência no investimento público, ora o fez travar às quatro rodas, quando Schäuble para tal lhe deu ordens.
Há ainda outra divergência entre o que pensamos, eu e o Jaime Santos a respeito do crescimento económico. Eu defendo que, no âmbito do investimento nas novas tecnologias, ainda há muito espaço para crescimentos robustos da economia portuguesa, sem pôr em causa os nossos ecossistemas, antes pelo contrário os acautelando com inventos inerentes a aumentos de rendimentos na produção das diferentes variantes das economias renováveis. Embora tenha presente a inevitabilidade de estar iminente essa fase civilizacional em que o planeta não suportará mais crescimentos na demografia e no uso e abuso dos seus recursos naturais não renováveis.
Deixo-vos, pois, com as pertinentes opiniões do Jaime Santos:
"Importa ser-se minimamente justo. Em primeiro lugar, a dívida pública começou a crescer a partir de 2008, devido à política expansionista de Sócrates destinada a combater a recessão, devido à alteração do perímetro orçamental exigida por Bruxelas (integração da dívida das empresas públicas na dívida pública) e devido à quebra brutal da receita (mais de 4 mil milhões por contraposição aos 800 milhões gastos pelo Governo de Sócrates em medidas expansionistas).
Já chega responsabilizar Passos e Portas por aquilo que eles são realmente responsáveis. Mais, Pires tem razão quando aponta o Euro como o principal responsável pelo endividamento externo. Baixas taxas de juro aliadas a baixo crescimento por falta de competitividade e importações baratas são o principal responsável pelo aumento do endividamento...
Agora, quem defende (como eu defendo) a renegociação da dívida tem que completar a frase e explicar se o País se vai continuar a endividar como dantes (Estado incluído), pelo que terá que crescer os tais 3% ou mais ao ano, para que o ratio dívida/PIB não aumente, o que não só é difícil como tornará o País rapidamente vulnerável a condições de financiamento mais severas (aumento da taxa de juro), que não controlámos, ou se pelo contrário deveremos daqui em diante passar a ter as contas públicas controladas (e reconheça-se a trajetória descendente do deficit iniciado por PPC). E neste último aspeto, eu tenho que dar razão aos verdadeiros Conservadores (os Ecologistas), até por razões de sustentabilidade ambiental..."
Ali Enaiza
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