Agora que toda a campanha mediática necessária para pôr em causa a estratégia do governo para reestruturar e recapitalizar a Caixa Geral de Depósitos tende a falhar (até José Gomes Ferreira acusa o PSD de fazer «política de terra queimada» com tal objetivo), abre-se nova frente por parte de quem não desiste de manter o grande banco público nas primeiras páginas dos jornais. E ela é evidenciada no «Público» desta quarta-feira com o regresso ao péssimo investimento no grupo petroquímico La Seda durante o governo de José Sócrates, com Carlos Santos Ferreira e Armando Vara na Administração do banco.
Não é nenhuma novidade, porque já se sabe há muito tempo da anunciada impossibilidade de recuperar os 900 milhões de euros investidos nas empresas do grupo em causa. Este tem sido, aliás, um dos casos ventilados como estando nas investigações do ministério público no âmbito da Operação Marquês, condenado como os demais a chegar a nenhures porque, podendo servir de caso de estudo para opções políticas e económicas erradas, não configura nada do foro criminal.
Essa é uma realidade com que a política e a gestão se têm que haver e onde não há volta a dar-lhe: há projetos que parecem ter grandes virtualidades no sentido de se tornarem extremamente lucrativos e acabam por se revelar desastrosos. O caso La Seda é, a esse título lapidar. Por um lado, porque expressou uma estratégia falhada de José Sócrates e Manuel Pinho, que defendia a necessidade de existirem grandes empresas de dimensão ibérica capazes de competirem em dimensão e massa crítica com as concorrentes no mercado internacional. Quem poderia, na época, contestar essa tese?
Por outro, os investimentos do grupo La Seda em Sines não só prometiam criar centenas de postos de trabalho e revitalizar um pólo industrial com um potencial muito longe de estar devidamente explorado, como perspetivava a possibilidade de facilitar o acesso a tecnologias de ponta a nível internacional. Uma vez mais perseguia-se o objetivo de abandonar indústrias obsoletas, baseadas apenas no recurso a mão-de-obra barata, por outras com capacidade de terem futuro prolongado. E quem nega ter sido bem intencionada essa visão, que as circunstâncias frustraram?
Justificava-se, assim, o risco num investimento, que até era bastante menor do que o próprio Deustsche Bank (de então ainda impoluta reputação!) dava mostras de acompanhar? Claro que sim!
É verdade que correu mal e acarreta um prejuízo muito significativo, mas o problema não terá sido o de falta de acompanhamento e de pedido de garantias, que só demasiado tarde se entendeu insuficiente? E, comparativamente com o que o país perdeu com as privatizações apressadas promovidas pelo governo da direita, capazes de garantirem autêntico filet mignon a preços de entrecosto, como sucedeu por exemplo com os CTT?
O poeta António Aleixo tem aquela célebre quadra, que diz ser mais eficaz a mentira, que contenha nela alguma coisa de verdade. A estratégia agora seguida pelos que apostam na lenta e contínua degradação da imagem internacional da Caixa Geral de Depósitos visa assim três inimigos de estimação dos seus executantes: o banco, o antigo primeiro-ministro socialista e o Partido Socialista no seu todo, ao qual se quer colar a capa de força política gastadora e perdulária.
Que importa ser outra a perspetiva hoje assumida por esse mesmo Partido Socialista no governo, depois de todas as lições recolhidas com a crise de 2008 e a mudança de paradigmas por ela suscitada?
A nomeação da equipa de António Domingues para a administração da Caixa Geral de Depósitos visa fazer da instituição o que um banco público deverá ser: racional e rentável nos créditos concedidos, proactivo na dinamização da economia, sem ceder às pressões políticas para servir de facilitador a negócios vistosos, mas demasiado imprevisíveis para merecerem a devida confiança.
Miró
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