terça-feira, 15 de julho de 2014

O Síndrome de Ermesinde

Foi um compromisso tácito que, ainda que tardiamente, Maria de Belém e a candidatura de António José Seguro assumiram depois das lamentáveis imagens de insultos a António Costa à saída da Comissão Nacional decorrida em Ermesinde. Nessa altura ficou claro que todos quantos apoiam o ainda secretário-geral assumiriam uma conduta responsável de acordo com a ética devida a quem integra o Partido Socialista.
Afinal a máscara não consegue manter-se afixada nos que se diziam dispostos a participar na atual disputa com elevação e respeito para com quem pensa de forma diferente da sua. Estamos perante um efeito patológico a nível de comportamento de massas, que poderemos designá-lo doravante como «o síndrome de Ermesinde».
Vejamos, então, em que consiste: ontem estava previsto decorrer um debate entre apoiantes de António José Seguro e António Costa num hotel de Belverde, no concelho do Seixal. Organizado pelo social-democrata Paulo Edson da Cunha e pelo jornal «Sem Mais», contava com a presença de Álvaro Beleza e Samuel Cruz pelo lado de Seguro e Eduardo Cabrita e Ricardo Ribeiro pelo de Costa.
Se a sessão começou como se esperava, com cada um dos participantes no painel a apresentar as razões para se colocarem de um ou do outro lado da contenda, depressa foi possível perceber que os apoiantes de Seguro não estavam ali para deixar falar Eduardo Cabrita ou Ricardo Ribeiro. Estavam ali preparados cinco provocadores para insultarem ou, no mínimo, interromperem quem deveriam ouvir com a mesma conduta ordeira, que tinham mostrado quando falavam Beleza ou Cruz.
Por muito que os moderadores incentivassem à contenção os referidos provocadores mostraram-se insensíveis a tais apelos. O que não deixa de ser paradoxal: é a candidatura de António José Seguro quem mais tem falado de valores, não hesitando acusar António Costa de traição, e no entanto são os seus apoiantes quem mostram falta de educação e de respeito pelos outros, querendo unicamente cortar-lhes o direito à palavra.
Naquele momento justificou-se a dúvida: e se o episódio de Ermesinde não foi um caso isolado, mas uma conduta recorrente que se repetirá sempre que houver debates deste tipo? E será que os tais debates, que os apoiantes de Seguro tanto pretendem exigir  a António Costa, visarão transformá-los na mesma lógica de «peixeirada» com que aqueles tanto se parecem deleitar?
É que esta questão do deleite não é mera presunção: durante as intervenções de Eduardo Cabrita e de Ricardo Ribeiro, sempre que surgiam os insultos e as invetivas desrespeitosas, Samuel Cruz não conseguia disfarçar o sorriso de quem via a sessão correr-lhe de feição. Mas, não contente, ainda daria uma machadada final no que deveria ser um comportamento ético e democrático: na sua última intervenção prescindiu da palavra para a atribuir a uma das principais provocadoras. A mensagem estava dada: em sessões similares, se existirem debates, podem sabotá-los à vontade, que acabarão por ser premiados com o direito à sua indigente argumentação.
No recente Mundial de futebol, quando algum adepto entrava em campo, as câmaras desviavam-se para não beneficiar o infrator. Enquanto um dos principais cabeças de cartaz dos seguristas no concelho, Samuel Cruz deu o sinal contrário: podem comportar-se indignamente, sem qualquer compostura, que a barbárie fica avalizada.
Em suma, perdeu-se uma boa oportunidade para debater o futuro do Partido Socialista e contribuir para a urgente alternativa que os portugueses tanto anseiam. Foi a demonstração da «síndrome de Ermesinde» em todo o seu fulgor...


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