quinta-feira, 23 de abril de 2020

Uma boa oportunidade para Cotrim ter ficado calado


1. Durante umas quinzenas, enquanto foi inquietante novidade na Assembleia da República, prestei particular atenção ao momento dos debates em que o primeiro-ministro via-se confrontado com as perguntas do deputado situado na mais extrema posição das direitas. Sabendo-o levado ao colo por um coro de fiéis nas redes sociais e pelos jornais da Cofina, aferia o perigo que poderia vir a constituir no futuro. Mas depressa me desinteressei da pugna: o sujeito em causa é tão contraditório e primário no que defende, que António Costa não precisa de recorrer aos reconhecidos dotes de tribuno para o devolver rapidamente à insignificância.
Desaparecida Assunção Cristas e estando o CDS confinado às inconsequentes telmices de quem comanda o exíguo grupo parlamentar, ganha acrescido interesse a intervenção do ultraliberal de serviço. Menos execrável que o desventurado vizinho, detetando-se-lhe até educação menos trauliteira, Cotrim de Figueiredo lá vai fazendo os possíveis para manter desfraldada a bandeira pró-liberdade total para os mercados. Só que a pandemia tem acentuado a importância determinante do Estado em tudo quanto é feito para a combater e para lhe vir a debelar os efeitos na economia. Daí que, uma vez mais, o representante da Iniciativa Liberal investiu desajeitadamente pelo lado da ineficiência do Estado no apoio aos empresários, que se andariam a queixar da excessiva burocracia no acesso aos programas para eles aprovado.
Letal, António Costa espetou-lhe dolorosa farpa: “Vou-lhe dar uma amarga notícia: foram os socialistas quem inventaram o Simplex e foram os liberais que o meteram na gaveta”. De facto, quanto tempo ficou perdido na maximização da eficiência da Administração Pública quando, entre 2011 e 2015, Passos Coelho e os seus cortesãos deitaram a perder todo o trabalho criado nos anos anteriores pela equipa de Maria Manuel Leitão Marques?
Cotrim só pode corresponder com aquela expressão conformado de quem intimamente sentiu quão preferível teria sido ficar calado.
2. Muito positiva a decisão tomada pelo Ministério da Cultura, que anunciou a compra de 400 mil euros em livros a pequenas editoras e livreiros cuja condição financeira era de manifesto estrangulamento devido à pandemia. E, ao mesmo tempo, também antecipou as bolsas literárias atribuídas anualmente a projetos de alguns escritores. 
Estas são daquelas notícias positivas sobre as quais a maioria das televisões não diz uma palavra...

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