domingo, 5 de abril de 2020

Os maus exemplos que nos fazem temer o que será o novo normal


Amanhã Marcelo Rebelo de Sousa vai convocar os banqueiros por videoconferência para os sensibilizar quanto à postura, que assumirão perante os portugueses nos próximos tempos. Obviamente,  armando-se em príncipe de Falconeri que, no romance de Lampedusa aconselhava a que se mudasse alguma coisa para que tudo ficasse na mesma.
Prestimosos, mas sempre a segurarem a carteira, os referidos banqueiros não deixarão de permitir a Marcelo regozijar-se com as demonstrações de boa-vontade que depressa constataremos serem do tipo uma mão vazia e outra cheia de nada.
Razão tem o meu amigo (e de muitos outros dignos desse nome) Arnaldo Serrão que classificou a iniciativa - e já agora a de Rui Rio na semana passada - como armarem-se ao pingarelho! É que, nesta altura, até o Financial Times faz editoriais a proclamar a importância de se devolver ao Estado o estatuto negado pelos cultores da sua redução à mais mínima expressão. Não só os da atual Iniciativa Liberal, mas também todos quantos integraram o desgoverno de Passos Coelho em 2011, nessa altura a babarem-se de satisfação por encararem as circunstâncias com a expetativa de tudo privatizarem de quanto ainda permanecia na alçada do Estado. O resultado viu-se com os CTT, a ANA, a TAP e demais empresas vendidas a pataco. Mas não só: temos de ir ainda mais atrás, aos tempos desditosos do cavaquismo quando, por preconceito ideológico ou a pretexto das imposições europeias, se deu cabo da capacidade produtiva nacional, na época capaz de corresponder rapidamente e com qualidade a muitos dos produtos hoje encomendados a outros mercados e sem nos chegarem com a celeridade necessária. Carvalho da Silva lembra-o na sua crónica semanal do Jornal de Notícias num texto que deveria conhecer uma merecida e extensa divulgação.
São os que se reveem nesses desgovernantes de má memória que, agora, estranham ser António Costa a anunciar as medidas que o seu governo acabou de definir para a presente fase da crise. Como se coubesse a Marcelo essa prerrogativa, ele que nada mais faz do que andar num afã, visitando fábricas e plantações, debitando banalidades a velocidade meteórica, só para aparentar que dita alguma coisa de substantivo. É que, como afirmava um professor de Harvard, Bill Hanage, estamos a tentar construir o avião enquanto o pilotamos. Ora, no cockpit não cabe Marcelo, nem sequer aqueles dois autarcas laranjas - Salvador Malheiro e Ribau Esteves - que proferiram enormidades só para que os seus munícipes julguem que a eles se deve o que de positivo está a acontecer-lhes. Mas, nessa corrida de saltos para ver quem consegue melhor destacar-se da sua pequenez, o supremo ridículo vai para o aldrabão que, não tendo outra habilidade para dar nas vistas, demite-se da liderança do seu deplorável partido, ciente de merecer assim alguma atenção nos telejornais.
Se Vítor Belanciano ansiava no «Público» para que advenha algo que entendamos como normal, que supere este desafiante momento - mesmo sendo um «novo normal» -, adivinha-se que com estes maus exemplos, ele não se afigurará afinal muito diferente do que foi.

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