terça-feira, 14 de abril de 2020

Os sinais contraditórios destes dias de confinamento


Nestes dias de confinamento justificam-se alguns comportamentos bipolares: se por um lado podemos congratularmo-nos por vivermos na sétima melhor democracia do mundo, de acordo com o estudo apresentado pelo instituto sueco V-Dem, podemos sempre imaginar onde nos situaríamos acaso ainda suportássemos Passos Coelho como primeiro-ministro, ou mesmo Rui Rio, por muito assertivo, que se queira revelar nestas circunstâncias.
Prosseguindo no mesmo registo podemos acreditar existirem muitos crédulos finalmente convencidos de não precisarem de um qualquer deus para os aliviar do terrível vírus, mas também constatamos quão imbecil é a teimosia fanática dos organizadores do compasso em Barcelos.
Inquietamo-nos com o que significará um défice de dois dígitos no PIB deste ano, mas podemos ganhar algum alento com a probabilidade de vermos a TAP ser a primeira empresa a re-nacionalizar-se de quantas as direitas entregaram criminosamente aos interesses privados.
Preocupam-nos as limitações ainda verificadas no Serviço Nacional de Saúde, mas confiamos que ele ficará mais robusto em meios humanos e materiais depois de vencida esta crise. Ademais com capacidade de concorrer com outra eficácia contra quem vê na medicina um negócio, demonstrando-o de formas indecorosas nos últimas dias com o episódio da tentativa de cobrança ao Estado de doentes, que ele não lhes encaminhara.
Estranhamos o modelo de regresso às aulas neste terceiro período, mas saudamos o que António Costa promete para o próximo ano letivo: o investimento em equipamentos e acesso à internet para todos os alunos no próximo ano, que potenciará a relevância do ensino público.
Ouvimos a decisão do governo em não repetir a receita de resposta à crise económica imposta há dez anos e que se traduziu em cortes de salários, de pensões e de serviços públicos, acentuando a queda no consumo e no investimento, penalizando a atividade económica, a criação de emprego e as contas públicas, como no-lo recordou Ricardo Paes Mamede num excelente texto no «Diário de Notícias» de hoje. Mas adivinhamos as dificuldades em exigir à União Europeia a revisão de Tratados para não deixar cada país entregue a si mesmo com dívidas acima dos 150%.
Temos tanto maior razão para confiar neste governo quanto, em contraponto, lemos na entrevista de Miranda Sarmento ao «Eco» que, aquele a quem Rui Rio apoda de «seu Centeno», considera esses constrangimentos como irreversíveis pondo-se na posição, que Diogo Martins no «Ladrões de Bicicletas» compara com a da mãe católica a quem a filha confessa a vontade de se divorciar, porque violentada pelo marido e lhe riposta: «casaste com ele, agora aguenta».
Não! Manifestamente não casámos com a União Europeia para uma relação que nos prejudique. Acaso tal suceda há que ter a coragem de dizer não. Marques Mendes ou Paulo Rangel, cultores da lamentável tese cavaquista do «bom aluno», prefeririam de António Costa a postura do antecessor, sempre timorato nas reuniões europeias, desprezado pelos demais, remetido para um canto. Com António Costa sabemos que não será assim: aquilo que o deputado europeu do PSD considera uma bravata é muito mais do que isso: é a afirmação corajosa de um líder que baterá o pé e não se renderá aos ditames de quem não se mostra à altura do que o atual momento político exige.

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