segunda-feira, 24 de setembro de 2018

A incompatibilidade de dois ministros com os valores fundamentais do Partido Socialista

Nos trinta e tal anos de militante socialista têm sido muitas as ocasiões em que o desconforto muito justificadamente se instalou. Basta olhar para o concelho onde moro, o Seixal, e ver mais do que justificada a decisão de em nada colaborar com a atual Concelhia, dominada por quem não desmerece qualquer afinidade, sobretudo não esquecendo a forma como os apoiantes de António Costa aqui foram tratados no período anterior à sua vitória nas Primárias contra António José Seguro, quando esses supostos «camaradas» utilizaram os mais insidiosos meios para fazerem prevalecer no cargo o anterior secretário-geral. Socialismo nada tem a ver com tais comportamentos e, por isso mesmo, nas mais recentes autárquicas militei ativamente no concelho de Almada para que a Inês Medeiros ganhasse a Cãmara, o José Ricardo a Costa de Caparica e a Sandra Chaíça a União das Freguesias de Caparica e da Trafaria.
Ansio, porém, pelo momento em que novamente possa dar o contributo militante na área de residência onde continuarei a habitar. Tendo em conta a pobreza franciscana da atividade local, não duvido que outra dinâmica se justifica.
Mas, a nível nacional, depois de António Costa e Francisca Van Dunem me oferecerem a alegria de terem despachado Joana Marques Vidal da forma como o fizeram, dois ministros são motivo do meu justificado desagrado. Um e outro estão a fragilizar um governo que, na reta final da legislatura, não pode ficar sujeito a tão óbvias fragilidades.
O primeiro é o titular da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, que andou a dar sucessivos tiros nos pés com a mudança do Infarmed para o Porto, até decidir que deixa tudo na mesma. Mas se esse caso indicia inépcia, já a Lei de Bases da Saúde, que pretende levar a Conselho de Ministros tendo por articulado o trabalho que a Comissão de Maria de Belém preparou, tudo se torna mais grave. Esse texto, que será lamentável se vier a ser assumido pelo Partido Socialista, constitui uma desautorização póstuma a António Arnaut, que a enormíssima maioria dos socialistas tanto admirou e cujo legado a lobista dos dos hospitais privados pretende sabotar. Todas as notícias dos últimos meses sobre os problemas nos hospitais e centros de saúde do setor público, embora com algum quê de verdade, foram enfatizadas para fundamentar a proposta do PSD e de Maria de Belém sobre a possibilidade de se tornarem concessões privadas. A tal acontecer teríamos a vitória definitiva dos que anseiam fazer da Saúde um lucrativo negócio dos grupos privados e da Igreja Católica, através das Misericórdias, escusando-se a entendê-la como um serviço público, do qual se reconheça a obscenidade de se retirar lucro.
Tendo em conta que a conspiração contra o SNS inclui representantes sindicais e das ordens dos médicos e enfermeiros, só um ministro com suficiente determinação para não ceder aos grupos económicos, que têm manipulado a opinião pública, com injustificado alarmismo sobre a eficiência dos cuidados de saúde facultados aos cidadãos, poderá derrota-los. Ora Adalberto Campos Fernandes não tem estado à altura dos desafios, que deveria vencer.
O outro exemplo tem a ver com o clima intimidatório e totalitarista, que a Administração da Fundação de Serralves, liderada por Ana Pinho, tem imposto contra o diretor artístico e quase todos os colaboradores da instituição, muitos deles demissionários das suas funções. O ministro da Cultura poderá alegar não ter condições para contrariar a conduta fascizante de quem ainda ali manda a pretexto de se tratar de entidade privada, mas os dinheiros públicos ali investidos deveriam dar a Luís Filipe de Castro Mendes a legitimidade para travar o escândalo suscitado por quem possui uma perspetiva ultrapuritana perante a obra notável do fotógrafo Robert Maplethorpe. O prestígio internacional que Serralves muito merecidamente conheceu até há pouco tempo está em vias de se perder com a divulgação das práticas censórias agora trazidas a público.

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