A exemplo do sucedido no nosso país as ruas das grandes metrópoles africanas andam a ser invadidas por lojas de artigos chineses. Têxteis, telemóveis e outros artigos de consumo tornaram-se quase exclusivo de fornecedores e vendedores vindos do grande país asiático. Mas, em contraponto, o regime de Pequim vê a África como o novo Eldorado donde pode aprovisionar-se das muitas matérias-primas de que é fértil consumidor. O que justifica os receios de alguns ocidentais, temerosos de verem concretizar-se uma nova realidade geopolítica: a Chináfrica.
Olhando para o que está em questão temos um país de 9,6 milhões de km2 e 1,4 mil milhões de habitantes a interagir com um continente de 30,4 milhões de km2 e 1,2 mil milhões de habitantes distribuídos por 54 países. Outros indicadores importantes são os do crescimento - 6,6% e um PIB de 14 000 biliões de dólares para a China e 3,8% e 2 400 biliões de dólares para o conjunto africano. É, pois, notório, o desequilíbrio entre a grande potência asiática e o fragmentado continente onde está a entrar economicamente de forma acelerada.
Se há indícios da presença chinesa em África no século XVI, foi com o regime de Mao, que se iniciou uma proclamada política de ajuda ao desenvolvimento, através do financiamento e construção de grandes infraestruturas.
A chegada do novo milénio trouxe um salto qualitativo no desenvolvimento da China, transformado num ávido importador de petróleo e outras matérias-primas. A África, pródiga em riquezas naturais, transforma-se num dos seus grandes fornecedores. O Sudão do Sul, o Gabão, o Congo e Angola fornecem-lhe os hidrocarbonetos. A Zâmbia e o Congo garantem-lhe o cobre, enquanto o alumínio provém da Guiné. Da Namíbia recebe a platina, enquanto a prata, os diamantes e o chumbo seguem da África do Sul. A madeira em estado bruto provém de Moçambique, a Guiné Equatorial e os Camarões.
Em apenas quinze anos as trocas comerciais entre a China e África explodiram passando de menos de uma dezena de mil milhões de dólares em 2002 para mais de 150 em 2017. A partir de 2009 a China transformou-se no principal parceiro de negócios com a Africa com 15% desse mercado, com destaque principal para as relações com a Argélia, o Egipto, a Nigéria, a Etiópia, o Quénia e Angola. Para facilitar essa penetração os chineses andam a construir linhas ferroviárias por onde melhor poderão movimentar as mercadorias. E os empréstimos bancários tornam-se um instrumento de influência política tão eficaz, que 1/3 da enorme dívida exterior angolana está subordinada a créditos chineses. Como o pagamento é feito em barris de petróleo a queda do preço dessa matéria-prima nos mercados internacionais obrigou o governo angolano a entregar à China quantidades significativamente mais elevadas dessa matéria-prima para corresponder aos compromissos anteriormente contraídos.
Olhando noutra perspetiva para a invasão de produtos chineses nos mercados africanos os preços baixos impedem o desenvolvimento de uma indústria local, mormente na área do vestuário, constituindo um travão ao desenvolvimento. Mas, por outro lado, a facilitação das comunicações pela expansão do recurso aos telemóveis age em sentido contrário, constituindo alavanca relevante no desenvolvimento de novos negócios.
Os chineses também beneficiam de uma mão-de-obra muito barata, que os leva a construir com custos mínimos e lucros maximizados as obras que estão a fazer no continente, nomeadamente a linha de caminho-de-ferro entre Adis Abeba e Djibuti ou o gasoduto entre a região somaliana do Ogaden e aquele mesmo porto no golfo de Áden, que se transformou num dos principais entrepostos por onde se escoam matérias-primas para os navios chineses.
Olhando, igualmente, para essa mão-de-obra barata e sem quaisquer direitos sindicais os chineses polvilharam o continente de grandes zonas industriais onde, em imensos hangares, milhares de operários e operárias fabricam os produtos destinados às tais lojas de grande consumo. Comandadas obviamente por capatazes chineses, essas fábricas remuneram os trabalhadores com ordenados que correspondem a 1/4 dos auferidos pelos chineses, que os produzem no seu país. A sinistra ditadura etíope está a ser transformada pelos chineses no grande aliado para converter o país numa das suas gigantescas fábricas à escala global.
Os 15% que a China preenche nas trocas comerciais com África não são, porém, tão significativas como as havidas com a União Europeia (36%) que, se potenciasse a sua identidade continental, conseguiria concorrer bastante mais eficazmente do que o consegue ao distribuir-se entre os 6% da França, os 4% da Alemanha e a importância ainda menor dos demais vinte cinco países que a integram. Poderá ser essa realidade diversificada na segmentação dos parceiros comerciais que sirvam à África para alcançar melhores condições de negociação autonomizando-se do garrote chinês, que se procura consolidar através da via marítima da Nova Rota da Seda - que faz dos portos de Mombaça e de Djibuti dois dos seus principais entrepostos estratégicos! -, do milhão de chineses já a viverem em África e dos 2500 soldados chineses que integram as missões da ONU no Mali, no Sudão, no Sudão do Sul e na Rep. Democrática do Congo. A divulgação da língua e da cultura chinesas também estão a ser difundidas em África através de 54 Institutos Confúcio, espalhados pelas maiores cidades co continente enquanto noutra vertente os estudantes africanos a estudarem na China ao abrigo de programas de cooperação passaram de dois mil em 2003 para os atuais 50 mil num crescimento exponencial, que tende a prosseguir. Concorrendo com os franceses e com os norte-americanos o regime de Pequim pretende ter uma influência determinante nas futuras elites africanas.
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