Existem expressões que os mais timoratos em se assumirem de esquerda usam para eufemizar as suas posições: reformismo é uma de entre muitas outras. Dizerem-se «socialistas» é que não, por temerem as associações com pretéritos líderes internacionais, que deram mau nome à expressão, sem dela terem conseguido ser autênticos intérpretes, mesmo com alguns a terem-no tentado com sincero empenhamento.
A atual direção do «L’Obs», nome abreviado do histórico « France Observateur» e «Le Nouvel Observateur» segue esta linha, da qual o anterior diretor, Jean Daniel, foi pioneiro assumido. Mas, mesmo recorrendo a fórmulas habilidosas para disfarçarem quem julgam querer ser, esses exegetas do reformismo acabam por desembocar onde mais importa: na encruzilhada entre ser-se consequente na intencional transformação da realidade ou apenas fingir-se que se o pretende por aceder a compromissos mais próximos da rendição.
Por isso mesmo o referido Jean Daniel emitira um juízo paradoxal, se não mesmo absurdo na efetiva dimensão do que significavam as palavras utilizadas: que ser-se reformista era mostrar ambição em vez de renúncia às nossas leis e regras, e isso significava apostar-se numa postura radical. Ora, a radicalidade impõe a forte probabilidade de ruturas, quando as negociações com o campo político contrário só impõe bloqueios e impasses. Algo que Matthieu Croissandeau, o sucessor de Daniel, muito teme, razão porque elogia François Chérèque, o sindicalista histórico da CFDT, desaparecido recentemente. Alguém que se dizia incapaz de resignar-se com o fracasso de qualquer negociação, como se ela obrigatoriamente conduzisse a um consenso. Na realidade, o consenso por ele desejado mais não era do que a abdicação do que se pretenderia alcançar. Mas, entrando na mesma ambiguidade do seu mentor, Croissandeau reconhece a inevitável impopularidade da esquerda quando, no poder, mostra vergonha em o ser, como ocorreu com Hollande.
Só há algo em que o atual e o anterior diretor da revista em causa têm razão: importa analisar aprofundadamente a realidade a cada momento para, em função do que nela se interpreta, ajuizar qual a melhor estratégia. Com o risco de se vir a confrontar com uma situação como a do filme «Match Point», quando a bola se equilibra periclitantemente em cima da rede do court de ténis e acaba por cair para o lado errado. Que foi quanto sucedeu com o Brexit ou com a eleição de Trump. Porque situações existem em que a corda estica a tal ponto para cada um dos lados, que se arrisca a estoirar na direção indesejada...
Sem comentários:
Enviar um comentário