Em dois períodos diferentes do meu passado vivi algum tempo na Grécia, com uma diferença de dez anos. A primeira vez no final dos anos 70, quando a democracia ainda voltara há pouco tempo e era muito difícil encontrar quem falasse inglês. Na segundo, quando se aproximavam os anos 90 e a Grécia já entrara na CEE antes mesmo do que Portugal e a Espanha.
Alguns dos aspetos mais típicos aí reconhecidos tinham a ver com os rituais dos casamentos, sempre realizados ao fim da tarde, quando o crepúsculo estava quase a verificar-se.
Sobretudo, nessa segunda estadia, quando saía do estaleiro de Perama (onde acompanhava a requalificação dum navio de cruzeiros) e voltava a Pireu, a caminhada entre a paragem do autocarro e o hotel era ruidosamente assinalada pela passagem de diversos cortejos nupciais em direção às igrejas ortodoxas.
Porque os rituais mórbidos nunca me aliciaram, desconhecia-lhes as características até as ver ilustradas numa reportagem da BBC. Que só veio confirmar a justeza das minhas convicções ateias e a profunda antipatia por todas as religiões.
Passo a esclarecer: o negócio com os mortos é extremamente proveitoso para a Igreja Ortodoxa local, que já justificaria toda a má fama a ela associada por não pagar os impostos tão necessários à resolução dos problemas económicos e financeiros do país e ofender obscenamente os seus crentes com a obesidade bem nutrida da maioria dos seus sacerdotes.
Quando alguém morre a Igreja está lá para lhe dar os últimos sacramentos e acompanhá-lo à cova. Depois há o comércio dos memoriais, que mais não são do que umas missas em consolo dos defuntos com uma periodicidade não superior a 40 dias.
Após três anos sepultados, os corpos são exumados, novamente na presença do padre, que faz missa no local, antes de serem levados para os ossários. É caso para dizer que se viver é extremamente caro para um país levado à miséria pelos governos da Nova Democracia e do Pasok com a «providencial» ajuda da troika, morrer continua a custar muito caro às respetivas famílias.
Há, porém, outro problema a somar-se a esse: os cemitérios estão cheios, só havendo lugar para novos funerais à medida que se vão desenterrando os que chegaram ao ciclo dos três anos de aluguer das sepulturas. E, quer os ossários, quer as valas comuns, estão atulhadas até mais neles nada caber.
A solução lógica seria a cremação, mas a ela opõem-se os mais altos dignatários da Igreja, que contrapõem com o credo na ressurreição dos corpos, que essa bem mais ecológica solução impediria. Como acabaria, sobretudo, com o grande negócio na persistência de um comportamento coletivo para com os mortos, que essa alternativa tenderia a desmaterializar. Muito provavelmente ao criar na mentalidade grega a noção de inexistência de algo para além do fim da vida, muito rapidamente a Igreja Ortodoxa deixaria de ufanar-se de 98% da população permanecer sob a sua (lamentável) influência.
Com exemplos destes como não dar razão a quem defende ser a religião o ópio do povo e a causa de terríveis guerras?
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