Para quem adota uma perspetiva de esquerda quanto às realidades políticas, económicas e sociais, as conceções de Maurizio Lazzarato em torno do conceito de “capital humano” ou do individuo “empreendedor de si mesmo” não podem ser ignoradas, por serem argumentos ideológicos poderosos , que os neoliberais mais utilizam para melhor cumprirem os seus objetivos.
Esse conceito é apresentado pelos paladinos da ideologia neoliberal como a extensão lógica da competição do mercado a todas as áreas da vida social, fazendo com que, mormente na saúde, na educação e até mesmo nas opções de voto, as decisões de cada um sejam encaradas como investimentos do indivíduo.
Em vez de força de trabalho cada cidadão é visto como capital pessoal, capaz de fazer escolhas boas ou más, quando muda de emprego e aumenta ou diminui o seu “valor de mercado”.
Os riscos são transferidos das empresas e dos Estados para os indivíduos, que passam a encarar com naturalidade a inexistência de apoios sociais para situações de desemprego, de doença ou de velhice. A cada fase do percurso profissional o indivíduo é bombardeado relativamente ao seu alinhamento com as normas do mercado e com s critérios da sua permanente avaliação.
Ele nem sequer tem tempo para pensar que os riscos são-lhe quase sempre exteriores sem que possua meios para com eles lidar adequadamente. Até porque está permanentemente ameaçado pela precariedade e pelas dívidas contraídas para incrementar a formação ou até mesmo para se limitar a sobreviver (os célebres créditos ao consumo!).
O progressivo empobrecimento das classes médias obriga-as a endividarem-se para conseguirem uma habitação, pagarem propinas ou terem um duvidoso seguro de saúde. Tornam-se trabalhadores-devedores, consumidores-endividados. E a dívida privada, que geram, integra a mais global, que é a do próprio país.
Na volta levam com um discurso político continuamente martelado sobre estarem a viver acima das suas possibilidades.
A dívida tornou-se, assim, um poderoso instrumento político ao serviço da ideologia neoliberal e daí a necessidade de a neutralizar, de a converter num instrumento poderoso do confronto ideológico com os abutres, que se escondem sob a capa de credores…
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