Não há nenhum equívoco na posição que defendo sobre quanto se passa na Síria: mesmo reconhecendo motivos de censura ao regime de Bashar al Assad, considero-o bastante preferível à maioria dos que contra ele combatem, sejam os jihadistas do Daesh, sejam os outros grupos de rebeldes apostados em pôr termo à condição multicultural e multirreligiosa de todo o território agora transformado em terra queimada.
Católicos, mulheres e todos os demais grupos sociais e culturais declarados como não conformes com a perspetiva totalitária dos islamitas, todos têm a perder com o derrube do dirigente alauita. E por isso fogem para a Turquia, na expectativa de encontrarem transporte para o que julgam ser o el dorado europeu.
Um sítio onde possam recomeçar do zero, com um emprego a garantir remuneração regular e os filhos a acederem à escola é tudo quanto pedem os milhares de fugitivos, que se concentram em Mersin, na Turquia.
A reportagem com 26 minutos de duração, assinada por Pierre Creisson e Mériem Lay é dos documentos mais impressionantes sobre essa tragédia. Porque, em vez dos rostos anónimos, que vemos a serem salvos nas costas italianas, este filme dá-lhes identidades mais definidas. Os rostos ganham a expressão da sua ansiedade e inquietação e as vozes alternam entre o desespero e a vã esperança de alguma vez voltarem a ser felizes.
Trata-se de uma “viagem da morte para a morte”, tal qual designam a travessia do Mediterrâneo. Que nos meses mais recentes ganhou nova dimensão com os cargueiros decrépitos deixados à deriva a poucas milhas da costa italiana com centenas de refugiados a bordo depois de seis a dez dias em precaríssimas condições de sobrevivência.
Pierre Creisson dirigiu-se a Mersin com a expectativa de se fazer passar por um desses fugitivos e assim acompanhá-los na arriscada tentativa de chegar à Europa.
Durante semanas acompanha várias famílias outrora pertencentes à classe média síria, que venderam tudo quanto tinham para arranjar os milhares de euros com que se entregam nas mãos dos traficantes.
Instalados em pensões baratas controladas pela mafia turca veem as semanas a passar sem concretizarem o objetivo. A subnutrição torna-se numa realidade inevitável, que tende a vitimar os mais novos, muito embora os mais fortes também não deixem de adoecer com sintomas mais ou menos graves.
Após várias semanas de permanência num desses hotéis, Creisson desiste e volta à Europa. Onde fica a saber que, desapossados de todos os seus bens, aqueles com quem convivera acabaram abandonados à sua sorte pelos traficantes entretanto desaparecidos sem deixar rasto.
As imagens, que nos mostram a crueldade de tais situações, são terríveis. E afetam quem só pretendia viver pacificamente sem que lhes caíssem em cima circunstâncias contra as quais nada puderam fazer...
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