quinta-feira, 3 de maio de 2018

Para que o ruidoso silêncio se transforme num contra-ataque eficaz contra quem dele reclamou


Ontem, logo após o almoço, recebi a mensagem de um amigo, que muito prezo, a pedir-me a opinião sobre quanto se estava a passar com o Partido Socialista e quanto às vantagens ou desvantagens de ouvir-lhe alguém pronunciar-se, quando as suspeições sobre Manuel Pinho tendem a lançar uma sombra ainda mais obscura sobre um governo que teve tanto de bom a elogiar, desde a aposta na Ciência ou nas energias renováveis, até a simplificação administrativa ou a à requalificação dos portugueses através dos programas das Novas Oportunidades (e isto só para elencar quatro argumentos justificativos do seu nunca por demais fundamentado elogio). Logo, de seguida, enquanto trabalhava para uma Associação para a qual cá em casa nos voluntariámos, uma das suas sócias, conhecida pelo seu posicionamento comunista, veio interpelar-nos exatamente no mesmo sentido: não se justificaria uma reação do Partido Socialista, cujo silêncio começava a ser tido como demasiado ruidoso?
Não sabia então que Carlos César por um lado, João Galamba por outro e, mais à noite, Augusto Santos Silva, tratavam de responder efetivamente a essa necessidade. Embora eu ainda tivesse dúvidas sobre a bondade de se sair do princípio, desde muito cedo definido por António Costa, quanto a deixar à Justiça e à Política o que lhes cabe respetivamente sem terem de coincidir na oportunidade de se expressarem. Não esqueço uma das lições fundamentais demonstradas pelo Mestre Kurosawa no seu «Kagemusha» em que, perante uma conjuntura ameaçadora, vale a pena manter as posições em vez de optar pelo contra-ataque militar.
Passado um dia sobre todo este sururu sintetizo algumas conclusões, que há a retirar do sucedido:
1. ninguém me convence que o caso Manuel Pinho aparece nesta altura como mero acaso. Em vésperas do Congresso do Partido Socialista na Batalha, e depois de comprovadamente não terem conseguido que eventos semelhantes nos partidos das direitas tenham-nos beneficiado o que quer que fosse nas sondagens, os whisperblowers  responsáveis pela denúncia do caso, procurarão evitar que se trate de uma enorme consagração do que se conseguiu concretizar nestes dois anos e meio e no quanto se adivinha possível no futuro imediato e a médio prazo para que os portugueses usufruam de melhores condições de vida e sintam justificadas razões para sentirem confiança no quanto possam vir a alcançar.
2. tendo em conta que as direitas gostam bastante de pôr os governos socialistas em lume brando, procurando corroer-lhes os alicerces, ganhou novo alento a tentativa de deslegitimar alguns ministros por terem pertencido ao governo de José Sócrates, como se eventualmente fossem cúmplices, ou pelo menos coniventes, com os presumíveis crimes, que ainda estão longe de se revelarem comprovados onde o devem ser: nos tribunais. Viu-se isso mesmo no «Sem Moderação» do Canal Q, quando, no programa da noite passada, o ppd José Eduardo Martins quis fazer passar a ideia de não se compreender porque Vieira da Silva ou Augusto Santos Silva continuam a ser ministros do atual governo por se lhes assacar responsabilidades políticas, que só o proponente via. Imaginemos que, por hipótese académica, ambos os ministros se demitiam, logo as direitas exigiriam o afastamento dos que tinham sido nessa altura deputados, para, no fim dessa lógica, exigirem o próprio afastamento de António Costa.
É claro que tal exagero não tem razão de ser - e Daniel Oliveira, até mesmo mais do que João Galamba - tratou de lhe denunciar o absurdo, mas a estratégia está desenhada.
3. Outro dos ardis revelados pelas direitas nesta matéria tem a ver com o próprio Manuel Pinho, que nunca será demais lembrar que não era, nunca foi, nem nunca será militante socialista. Mas para os que tentam cavalgar à conta do caso, a questão que se põe é esta: porque terá Sócrates convidado tal BESman para integrar o seu governo. ´
É claro que a resposta é fácil e não há por certo ninguém que, desonestamente, a formula, que a não saiba: quando um Partido dá sinais de poder vir a ser governo existem iniciativas abertas a independentes onde se conjugam duas vontades distintas, mas episodicamente conciliáveis: os dirigentes políticos quererão aproveitar a tal abertura à sociedade civil para demonstrarem ao eleitorado, que os seus apoios não se cingem aos seus próprios militantes e simpatizantes, e os «cabeças-de-cartaz», que se fazem aparecidos, ora visam cumprir deveres de cidadania (quando são bem intencionados, e quero crer que assim sucede com a maioria!), ora satisfazer narcisismos íntimos, ora cumprir objetivos lobistas.
Quando Manuel Pinho começou a aparecer em conferências e outros eventos semelhantes do PS antes das eleições de 2005, confesso ter ficado surpreendido por o ter, até aí, associado ao CDS ou ao PSD. Mas como Freitas do Amaral também viria a integrar o governo, enquadrei-o na mesma lógica. Do que dele se sabia - a ligação ao Grupo Espírito Santo - nada justificava apreensões: não tinham os governos das direitas também ministros oriundos dessa que era entidade bancária de reputação ainda intocável no nosso universo político?
Não me espanta, pois, que José Sócrates o sentisse como mais-valia num elenco governativo, sem sequer suspeitar que pudesse ter outra agenda senão a de bem governar. E a verdade é que nada se prova até agora, que Pinho tenha agido no governo para beneficiar a empresa A ou B, pois até a suspeita EDP beneficiou dos seus escandalosos subsídios antes desse governo tomar posse, devendo-se à coligação PSD/CDS  a razão e ser dos indecorosos lucros de que tem usufruído.
4. Para concluir por ora com este assunto pode-se para já considerar que, nas últimas décadas - e se formos analisar detalhadamente a nossa História recente veremos essa realidade no próprio fascismo com a CUF de Alfredo da Silva! - o poder político tem andado a reboque dos interesses dos nossos capitalistas, cuja ganância e incompetência não têm conhecido limites. Seja por exercerem pressão insidiosa e permanente sobre quem governa (como sucede atualmente com a imprensa globalmente desfavorável ao atual governo!), seja porque a isso se presta intencionalmente, (como sucedeu com Passos Coelho, Cavaco Silva ou Durão Barroso!), os governos têm beneficiado quem quer ser dono disto tudo contra os que trabalham e pagam impostos.
Que esta seja a altura para pôr os empresários e acionistas no seu devido lugar é o que se exige ao Partido Socialista, que bem pode deixar-se de falinhas mansas e questionar porque, havendo uma atenção tão exclusiva em si, não se verificou igual preocupação com os sobreiros e os submarinos do Jacinto Leite Capelo Rego, com as Tecnoformas e os negócios de Dias Loureiro ou Miguel Relvas ou, sobretudo,  com todo esse polvo imundo que se chamou BPN.

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