1. Se há quem deveria mostrar algum recato em relação ao aproveitamento político da tragédia de Pedrógão Grande, Assunção Cristas figuraria por certo na primeira fila. Não foi ela quem, durante os quatro anos em que assumiu a responsabilidade pelas florestas portuguesas, cuidou de maximizar a plantação de eucaliptos?
A falta de vergonha é imensa quando aparece em tom pespeneta a inquirir António Costa na forma de vinte cinco perguntas divulgadas previamente à comunicação social.
Porque é educado e mostra um notável controle a reagir a tais desaforos, o primeiro-ministro por certo porá algum assessor a dar resposta à sucessora de Paulo Portas. Mas que o mais comum dos mortais trataria de atirar esse rol para o lixo não tenho a menor dúvida. Porque é esse o sítio certo para acolher tal obscenidade.
De qualquer forma, e muito embora o estar fora do país me impeça de acompanhar o debate quinzenal da próxima semana, está prometida violenta peixeirada por conta de Montenegro e de Cristas. Só tenho pena de não assistir em direto à elegância com que António Costa responderá com contundência assassina a tais figurões.
2. Estranhei as palavras equilibradas de Jaime Marta Soares no sábado, quando foi dos primeiros comentadores do sucedido em Pedrógão. Mas porque um escorpião nunca deixa de revelar a sua verdadeira natureza ei-lo a lançar a confusão sobre a origem do incêndio atribuindo-o a uma suposta mão criminosa.
Obviamente que a Judiciária não ficou satisfeita, tão lesta se tinha revelado a demonstrar a origem natural do sinistro ao encontrar a árvore atingida pela descarga elétrica ao princípio da tarde de sábado: não só ela tinha a casca aberta como sempre sucede nessas situações como o chão em volta estava com a terra recozida, mais arenosa e com um brilho diferente, quase vitrificado. De acordo com as melhores práticas científicas o ground zero do fogo não deixava a menor dúvida quanto á sua efetiva localização.
Perante a ciência, Marta Soares apostou em ser a voz por que esperavam todos os órgãos de comunicação social para apimentarem as suas reportagens: sem qualquer fundamento inventou a teoria da mão invisível. Ora os registos revelam que, entre as 14.30 e as 16 horas dessa tarde fatídica ocorreram trezentas descargas elétricas na região de Pedrógão Grande e que o alarme de incêndio aconteceu ás 14.43. Onde estão afinal os comprovativos de já existir ignição anterior a esse alerta?
Conseguindo lançar a confusão Marta Soares remeteu-se à clandestinidade: a Judiciária bem procura, que ele lhe dê as provas do que disse, mas o boateiro ainda não encontrou disponibilidade de agenda para o fazer. É preciso fazer um desenho sobre o que está aqui em causa?
3. O fenómeno, que terá apanhado de surpresa a maior parte das vítimas de Pedrógão tem uma designação, que desconhecia até agora: o downburst. Trata-se de uma massa de ar descendente , que chega ao solo e se espalha de forma radial, causando ventos fortes. Parece um tornado, mas não o é.
Em função de quem sobreviveu para testemunhar o ocorrido, os peritos inclinam-se para considerar este tipo de comportamento da Natureza como a causa mais provável para, em cerca de quatrocentos metros, morrerem tantas pessoas.
4. Nos meus “anos africanos” assisti muito frequentemente a trovoadas muito violentas, quer secas, quer húmidas. No Gabão, nos Camarões ou na Costa do Marfim, ou menos frequentemente na Nigéria ou na Serra Leoa, elas apareciam subitamente quase sem se fazerem anunciar e iluminando os céus plúmbeos com violentos encadeamentos.
O que terá sucedido em Pedrógão terá sido algo de semelhante: nas nossas latitudes são as nuvens em forma de flocos de algodão a suscitarem esse tipo de descargas, sobretudo se revelam significativa extensão vertical. Porque a camada de ar imediatamente abaixo de tal nuvem estava demasiado seca - a humidade estava abaixo dos 20%! - a chuva nela contida evaporou. Daí que os curto-circuitos entre a nuvem e terra firme contivessem tal perigosidade. Com as consequências conhecidas.
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