terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Mais um sonho lindo que acabou?


Embora seja algo tão óbvio como olhar para o Evereste e subir-lhe ao cume, simplesmente porque está lá - mas quem o disse nele encontrou a morte! - é difícil compreender a motivação dos turistas, que visitavam o vulcão da ilha White, quando ele teve assassina erupção. Cinco mortos somados a oito desaparecidos que, certamente já não conseguirão contar a surpresa, o medo e a dor de se terem acercado demais de um perigo cujo nível elevado estava declarado desde 18 de novembro. A adrenalina pode não ser fácil de controlar, mas a probabilidade de se perder a vida deveria constituir-lhe inibidor que bastasse.
Há perigos assim, que estão à vista, mas os incautos insistem em experienciá-los. Dois meses depois das eleições de outubro anda a ser essa a atitude dos que, na legislatura anterior, deram corpo àquilo que nunca gostei de designar como «geringonça». O Bloco e os comunistas exageram no que pedem para já, ignorando as cautelas e os caldos de galinha, que a situação económica e financeira do país recomendam, mas o governo também não facilita mostrando uma assertividade para com as pretensões patronais, que estas não justificam. Pearece esquecida a experiência vivida durante o guterrismo e o socratismo, quando as confederações empresariais começaram por reagir com aparente complacência às intenções de governos, que se seguiam a desgovernações incompetentes e, sobretudo, extremamente impopulares, para logo financiarem e fomentarem a criação de um clima social e político, que redundaria no «pântano» num caso e na pressão para a rendição à troika no outro, ambos implicando o regresso das suas marionetas ao poder.
Considero António Costa um homem inteligente e competente - razão para o ter diligentemente apoiado desde que se candidatou ás primárias de 2014! - mas anda a assemelhar-se em demasia aos visitantes da ilha White: sabe que o perigo está mesmo ali à beira e dele aproxima-se perigosamente sem cuidar do que possa inesperadamente acontecer. E, movidos pela mesma macabra curiosidade, o Bloco e o PCP para ele parecem atraídos, mesmo que de direções diferentes, sempre enjeitando a prudente distância, que a manutenção dos equilíbrios anteriores pressuporia.
Quem antes assegurava as pontes e negociava cumplicidades - Pedro Nuno Santos - foi empurrado para uma gaiola supostamente dourada, a exemplo de quem, na bancada parlamentar, as assegurava mediante o recurso à retórica contundente - João Galamba.  Em aparência estes dois meses fizeram crescer abismos em quem, inteligentemente, os aproximara suficientemente para estabelecer estimulantes pontes. Oxalá eles não se tornem novamente tão profundos que tenhamos de reconhecer que os quatro últimos anos foram mais um sonho -  mesmo que não tão lindo quanto o da canção do José Mário Branco - que acabou!

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